Depois dos concursos para descobrir jovens cantores e modelos, chegou a vez do cinema. O novo programa da RTP2 anda à caça de talentos.
Há mais de 20 anos que a biblioteca da antiga Faculdade de Ciências de Lisboa, na Rua da Escola Politécnica, não tinha tanto movimento. Em 1985, quando a faculdade foi transferida para as instalações do Campo Grande, a sala foi fechada a sete chaves e só os bichos do papel tinham acesso aos livros. Na passada sexta-feira, dezenas de câmaras, luzes e fios entraram pela sala e até um camarim foi improvisado no meio das estantes empoeiradas. "Andamos sempre à procura de sítios diferentes e esta sala já não era aberta ao público há anos e anos", diz ao i Rute Vale, produtora do programa da RTP2 "Fá-las Curtas", que estreou no sábado passado. "Falámos com os responsáveis e conseguimos autorização para filmar aqui."
Na biblioteca, ninguém parece interessar-se pelos livros antigos. As atenções da equipa de filmagens estão todas viradas para as indicações do argumentista Martim Camarão e do realizador João Farinha. Os apelidos dos dois miúdos de 21 e 25 anos são repetidos tantas vezes que alguém da equipa decidiu fazer uma piada: "Farinha, camarão, daqui a bocado temos moqueca..."
Se não conhece estes nomes não se preocupe. Nenhum dos câmaras e técnicos de luz e som tinham ouvido falar deles até há pouco mais de um mês, quando o programa "Fá-las Curtas" começou a ser gravado. "Aqui o desafio é dar oportunidade a jovens realizadores e argumentistas de fazerem curtas-metragens com dois minutos em tempo limitado", explica Rute Vale. Em cada episódio, duas duplas realizam uma curta-metragem em três dias no mesmo cenário com dois actores conhecidos e um guarda-roupa escolhido pela equipa de produção. No final, os realizadores Joaquim Leitão e João Garção Borges (do programa "Onda Curta") avaliam as curtas com pontos de 1 a 10 e escolhem a dupla vencedora, que passa à fase seguinte.
Martim e João já passaram a primeira fase do programa. "Ganhámos por um ponto com a curta ''Rosas do Paraíso'', um título horrível, eu sei", confessa Martim, que tirou o curso de cinema na Universidade Lusófona, em Lisboa. "Filmámos no [Cabaret] Maxime com o Vítor Norte e o Pedro Laginha. A rodagem não correu tão bem como esta, mas ficámos mais satisfeitos com o resultado final."
Os dois jovens conheceram a biblioteca onde estão a filmar no dia anterior, tal como a sua equipa rival, quando tiveram quatro horas para escrever o guião. À sua disposição têm os actores João Lagarto, de 56 anos, e Cristina Carvalhal, de 44 anos, que já estiveram em filmagens com a outra equipa durante a manhã. "Os actores nacionais têm aceitado bem o nosso convite", diz a produtora Rute Vale. "Já tivemos aqui no programa a Catarina Wallenstein, o Filipe Duarte, a Ana Bustorff, a Sofia Aparício, o João Didelet..."
Na curta de Martim e João, Cristina Carvalhal interpreta o papel da "Senhora do Tempo", que está sentada numa mesa a tricotar "no sítio para onde as pessoas vão quando morrem", explica João Farinha. "De manhã fui uma personagem meio enigmática que tem uma relação por esclarecer com o João Lagarto. Agora faço uma coisa mais esotérica", conta a actriz. Na sua opinião, trabalhar com pessoas com menos experiência "tem algumas vantagens": "Têm menos preconceitos e tiques, embora não estejam muito à vontade. Mas isso também acontece com pessoas que trabalham há muito tempo e que são tímidas..."
A maquilhadora Sandra Ramos transforma as personagens naquilo que os concorrentes idealizaram. "Como a maior parte são homens, às vezes ficam um bocado perdidos e não sabem pedir indicações", ri-se. "Mas tenho de usar outra linguagem. Para a curta de hoje pediram-me uma maquilhagem mais carregada para a Cristina, porque é uma personagem imponente, e para despentear o João."
Filomena Cautela, a apresentadora do "Fá-las Curtas", diz que o programa "não está nada atrás do formato canadiano ["Fais Ça Court!"] em que é baseado". "As pessoas que aqui estão [das 78 duplas candidatas foram escolhidas 16] querem mesmo fazer do cinema a sua vida e trabalham sem receber nada por isso."
"Foi uma boa oportunidade para termos um filme na TV", diz Francisco Baptista, concorrente do episódio de estreia do programa com a curta-metragem "A Cura". "Foi uma curta feita em tempo expresso, 13 horas, mas infelizmente fomos eliminados." O filme perdeu por um ponto com a dupla rival que passou à fase seguinte. "Além do júri acho que os actores com quem trabalhamos também deveriam poder votar, tal como a equipa técnica." João Farinha, que ainda está a concurso, concorda: "Isso era bom, até para sabermos a nossa prestação na direcção de actores."
A dupla que vencer o programa terá 10 mil euros para produzir outra curta-metragem para a RTP2, desta vez com 10 minutos.
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Fá-las Curtas, aos sábados, às 21h, na RTP2
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