Como se não bastasse essa coisa mágica de fluir do Encontro das Águas do Rio Solimões (barrento e de temperatura mais fria) com o Rio Negro (escuro e de temperatura mais quente) – que confluem ao largo de Manaus e, por quilómetros, correm lado a lado sem se misturarem –, sabe-se agora que o Rio Amazonas não se atravessa sozinho na mais longa caminhada do Mundo entre uma nascente e a sua foz. Corre paralelo a um segundo rio, um gigante de proporções idênticas às suas, com a diferença de ser subterrâneo.
A NOTÍCIA de que o estado do Amazonas pode ter não apenas o maior rio do mundo em volume de água, mas também o maior rio subterrâneo do mundo, já começou a fazer eco na mídia:
Rede Record - 25.08.2011
Como escrevia, um destes dias, o Marcos Santos lá no Varal:
Ele nasce nos Andes, mas começa no Acre o seu passeio silencioso.
É o Rio Hanza, companheiro subterrâneo do Amazonas, a 4 mil metros de profundidade e 6 mil quilômetros de extensão, do Acre ao Atlântico.
No momento em que esgotamos seus recursos naturais em busca de um desenvolvimento a todo custo, no instante em que usurpamos os humores do seu próprio clima e de sua temperatura, no período em que nos tornamos predadores das vidas que residem em suas águas, solos e ares, ela, a Mãe Terra, dadivosa e incondicional, sempre nos surpreende com seus presentes maravilhosos.
Até quando nossa deusa Gaia terá tanta paciência connosco?
Terá sempre a Grande Mãe um infinito amor?
[EM ACTUALIZAÇÃO]
Rio subterrâneo na Amazônia
Um estudo feito por pesquisadores da Coordenação de Geofísica do Observatório Nacional (ON), no Rio de Janeiro, revela indícios da existência de um rio subterrâneo, com a mesma extensão do Rio Amazonas, que estaria a 4 mil metros abaixo da maior bacia hidrográfica do mundo.
O Rio Hamza nasce no Peru, na Cordilheira dos Andes, mesma região que o Rio Amazonas. “Essa linha de água permanece subterrânea desde sua nascente, só que não tão distante da superfície. Tanto que temos relatos de povoados daquele país, instalados na região de Cuzco, que utilizam este rio para agricultura. Eles sabem desse fluxo debaixo de terrenos áridos e por isso fazem escavações para poços ou mesmo plantações”, afirmou o pesquisador indiano Valiya Hamza, do Observatório Nacional.
O fluxo da água deste rio segue na vertical, sendo drenado da superfície até dois mil metros de profundidade. Depois, próximo à região do Acre, o curso fica na horizontal e segue o percurso do Rio Amazonas, no sentido Oeste para o Leste, passando pelas bacias de Solimões, Amazonas e Marajó, até adentrar no Oceano.
“A água do Hamza segue até 150 quilômetros dentro do Atlântico e diminui os níveis de salinidade do mar. É possível identificar este fenômeno devido aos sedimentos que são encontrados na água, característicos de água doce, além da vida marinha existente, com peixes que não sobreviveriam em ambiente de água salgada”, disse.
A descoberta
A descoberta desse novo curso de água é fruto do trabalho de doutorado de Elizabeth Pimentel, sob orientação de Valiya Hamza. Ela indica que o rio teria 6 mil quilômetros de comprimento e entraria no Oceano Atlântico pela mesma foz, que vai do Amapá até o Pará. A descoberta foi feita a partir da análise de temperatura de 241 poços profundos perfurados pela Petrobras nas décadas de 1970 e 1980.
“A temperatura no solo é de 24 graus Celsius constantes. Entretanto, quando ocorre a entrada da água, há uma queda de até 5 graus Celsius. Foi a partir deste ponto que começamos a desenvolver nosso estudo. Este pode ser o maior rio subterrâneo do mundo”, afirma Hamza.
“Não é um aquífero, que é uma reserva de água sem movimentação. Nós percebemos movimentação de água, ainda que lenta, pelos sedimentos”, disse o pesquisador cujo sobrenome batizou o novo rio.
Apesar de ser um rio subterrâneo, sua vazão (quantidade de água jorrada por segundo) é maior que a do Rio São Francisco, que corta o Nordeste brasileiro. Enquanto o Hamza tem vazão de 3,1 mil m³/s, a do Rio São Francisco é 2,7 mil m³/s. Mas nenhuma das duas se compara a do Rio Amazonas, com 133 mil m³/s.
“A velocidade de curso do Hamza é menor também, porque o fluxo de água tem que vencer as rochas existentes há quatro mil metros de profundidade. Enquanto o Amazonas corre a 2 metros por segundo, a velocidade do fluxo subterrâneo é de 100 metros por ano.
Outro número que chama atenção é a distância entre as margens do Hamza, que alcançam até 400 quilômetros de uma borda a outra, uma distância semelhante entre as cidades de São Paulo e o Rio de Janeiro.
“Vamos continuar nossa pesquisa, porque nossa base de dados precisa ser melhorada. A partir de setembro vamos buscar informações sobre a temperatura no interior terrestre em Manaus (AM) e em Rondônia. Assim vamos determinar a velocidade exata do curso da água”, complementa o pesquisador do Observatório Nacional.
reportagem “Rio subterrâneo na Amazônia” exibida no programa Terra da Gente, da EPTV, em 26.08.2011 (com informações do Globo Natureza)
Nas profundezas da Amazônia, um rio
Agosto de 2011, cidade do Rio de Janeiro. Aquele que era para ter sido tão somente mais um Congresso Internacional da Sociedade Brasileira de Geofísica, aliás, o 12º, transformou-se numa importante vitrine para uma equipe de pesquisadores de Geofísica do Observatório Nacional, sediado no Rio de Janeiro. No evento, a equipe anunciou uma descoberta que percorreu o mundo prontamente: um rio subterrâneo que se movimenta 4 quilômetros abaixo do Rio Amazonas. Por que tal acontecimento despertou tamanho interesse? Afinal, as águas subterrâneas são um fenômeno conhecido desde longa data. Os poços artesianos, as fontes, os aquíferos atestam. Além disso, a infiltração das águas em rochas calcárias possibilita a formação de cavernas e grutas, e nessas cavidades as águas escoam como riachos subterrâneos. A ilustração ao lado pode fornecer uma ideia da dimensão da descoberta, justificando tamanha repercussão na mídia e no meio científico.
Observe que o curso d’água em cena, batizado de Rio Hamza, em homenagem ao pesquisador de origem indiana e coordenador das pesquisas, Valiya Hamza, possui cerca de 6 mil quilômetros de extensão. Mas não somente a distância percorrida impressiona: em determinados pontos, sua largura pode chegar a 400 quilômetros e sua vazão média é de 3.090 m. Para efeitos de comparação, o Rio Amazonas apresenta até 100 quilômetros de largura no local pesquisado, e o Rio São Francisco uma vazão média de 2.700 m.
Como tudo começou
Entre os integrantes da equipe de pesquisadores da Coordenação de Geofísica do Observatório Nacional está a doutoranda Elizabeth Tavares Pimentel, da Universidade Federal do Amazonas. A descoberta faz parte de suas pesquisas envolvendo estudos sobre geotermia, ramo da Geologia que estuda a temperatura do planeta em diferentes profundidades. Para os estudos de geotermia profunda, a pesquisadora -valeu-se dos dados de temperatura de 241 poços perfurados pela Petrobras ao longo das décadas de 1970 e 1980, na Amazônia. Tais perfurações aconteceram em bacias sedimentares da região. Como se sabe, esse tipo de estrutura geológica pode estar associado à ocorrência de petróleo, razão pela qual foram realizadas as perfurações. Por outro lado, os -terrenos sedimentares apresentam porosidade e permeabilidade tal que permitem não só o escoamento e a circulação da água, como tambem o seu armazenamento. Essas características auxiliam no entendimento do fenômeno. Na altura do estado do Acre, a circulação da água é vertical até cerca de 2 quilômetros de profundidade-, onde muda de direção para, em profundidades maiores, ao redor dos 4 quilômetros, tornar-se quase horizontal. Nesse aspecto, o Rio Hamza- mais uma vez se distingue do Amazonas: enquanto neste as águas se deslocam a uma velocidade de 0,1 a 2 metros por segundo, naquele o fluxo se dá na ordem de 10 a 100 metros por ano. De fato, as rochas -sedimentares se assemelham a uma esponja, ou melhor, o atrito causado pela rocha sedimentar impede o deslocamento mais rápido das águas.
A essa altura, duas breves conclusões podem ser tiradas. Em primeiro lugar, que um fenômeno dessas dimensões não pode acontecer em qualquer ponto da Terra. Além das condições climáticas, próprias da região equatorial, das particularidades geológicas e geomorfológicas da Amazônia, não se pode desprezar a extensão, a superfície onde o evento está se dando. Por exemplo, na África Equatorial há uma semelhança do ponto de vista climático na chamada Bacia do Congo. Contudo, os terrenos sedimentares africanos não se encontram orientados como no caso amazônico, tampouco atingem a faixa litorânea. Observe o planisfério.
Em segundo lugar, um trabalho com o alcance do realizado pela Petrobras na Amazônia brasileira também não se verifica em território africano. Até porque, naquele continente, a região da Bacia do Congo encontra-se compartilhada por diversos países.
Feitas essas considerações, não pode ficar de fora dessa breve reflexão o entendimento que se tenha de rio. Será o Hamza-, de fato, um rio mesmo que subterrâneo? Nos debates que se seguiram à exposição da equipe do Observatório Nacional, houve quem questionasse se tal corpo d’água pode ser enquadrado enquanto um rio ou se não seria tão somente um aquífero. Entre os argumentos foi citada a velocidade do fluxo das águas subterrâneas, tida como muito inferior àquela própria de um rio. Contudo, qual velocidade deve ser tomada como referência? A isso se pode incluir outra observação, de caráter escalar: aquilo que no Sul do País pode ser tomado como um “verdadeiro” rio, na Amazônia não passaria de um igarapé. Ou seja, no atual estágio da pesquisa a respeito do Hamza parece prematura a necessidade de se levantarem critérios que possam ou não justificá-lo enquanto rio.
Por fim, e buscando apontar para a relevância do achado, o volume de água que chega ao Oceano Atlântico pode ser associado à ocorrência de verdadeiros bolsões de baixa salinidade na margem continental, isto é, nas bordas laterais do continente junto à foz do Rio Amazonas. Na medida em que o entendimento sobre o processo de formação do Rio Hamza e sua relação com o ambiente da Região Amazônica avançam, certamente algumas lacunas serão preenchidas e verdades tomadas como definitivas revistas. Importa destacar que os limites acerca da exploração dos recursos amazônicos, ou das relações sociedade–natureza, ficarão mais claros. Considerando-se as dimensões amazônicas e o alcance dos processos que se desenrolam na região, é de se esperar que os cuidados ambientais sejam redobrados. Nesse sentido, a descoberta do Rio Hamza é bem-vinda ao campo das lutas pela manutenção do equilíbrio dinâmico da biosfera.
publicado na Carta Capital - 05.10.2011
Rio recém-descoberto é 'reserva' caso bacia amazônica se esgote, diz pesquisadora
Conversa com Elizabeth Tavares Pimentel, professora da Ufam e responsável pela descoberta
O recém-descoberto rio subterrâneo Hamza, localizado a 4 mil metros de profundidade debaixo do rio Amazonas e medindo 6 mil metros de extensão, tem água potável e pode ser consumida caso, um dia, a água doce da bacia amazônica seque.
"Eu acho que o rio Amazonas nunca vai secar, mas se isso acontecer algum dia, as populações da Amazônia podem contar com essa reserva", relata a pesquisadora amazonense Elizabeth Tavares Pimentel, referindo-se ao rio subterrâneo descoberto durante pesquisas desenvolvidas durante seu doutorado, no Observatório Nacional, no Rio de Janeiro.
Com formação em Geofísica, a professora da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) Elizabeth Tavares Pimentel foi responsável por uma das descobertas para relevantes para a ciência nos últimos tempos. A repercussão da divulgação do trabalho, após ser apresentado durante o 12º Congresso Internacional da Sociedade Brasileira de Geofísica, no Rio de Janeiro, e divulgado nesta quinta-feira (25) pelo Observatório Nacional, surpreendeu a pesquisadora.
"Vários jornais do Brasil e do exterior estão me ligando. Ainda não tive tempo para fazer muita coisa hoje (ontem)", disse Elizabeth em entrevista por telefone, do Rio de Janeiro.
Contribuição
Conforme Elizabeth, a curto e médio prazo, a contribuição científica da descoberta é que os estudos sobre o ciclo hídrico poderão levar em consideração o fluxo do rio Hamza - o nome é uma homenagem ao orientador de Elizabeth, Valyia Hamza.
"Quando se fala nos ciclos se recorre à chuva, aos lençóis freáticos, aos aqüíferos. Todos eles deságuam no oceano Atlântico. Os estudos deste ciclo não inclue, até então, o rio subterrâneo", explicou a pesquisadora.
Uma hipótese sugerida tanto por Elizabeth quanto por Valyia Hamza é que o rio subterrâneo também seja responsável pela baixa salinidade encontrada no Oceano Atlântico.
Vazão
De acordo com as pesquisas desenvolvidas pelos dois cientistas, o modelo adotado para a análises identificou que o rio Hazam tem 3, 09 mil metros cúbicos por segundo. Essa vazão é superior ao rio São Francisco, que possui 2, 8 mil metros cúbicos. O Amazonas possui 133 mil metros cúbicos por segundo.
"Esse valor é pequena em relação à vazão do Rio Amazonas, mas é indicativo de um sistema hidráulico subterrâneo, igantesco. Basta notar que a vazão subterrânea na região Amazônica é superior à vazão média do Rio São Francisco", disse Elizabeth.
A profundidade de 4 mil metros do rio Hamza também impressiona. Para se ter uma ideia, o rio Amazonas tem uma profundidade que varia de um metro (nas áreas mais rasas) a 50 e 100 metros. Outra característica do rio Hamza é a sua largura. Enquanto o rio Amazonas tem de 1 a 100 quilômetros de largura, o Hamza possui de 200 a 400 metros de quilômetros.
Campo
Bolsista da Fundação Estadual de Amparo à Pesquisa do Amazonas (Fapeam), Elizabeth Pimentel Tavares, que á natural do município de Parintins, tem previsão de concluir sua pesquisa em fevereiro de 2012. Os estudos desenvolvidos por Elizabeth Tavares Pimentel foram baseados em dados nos resultados das perfurações realizadas pela Petrobrás nos anos 70 e 80 quando a empresa realizava pesquisas para localizar petróleo.
"A investigação começou com bases em temperaturas realizadas em águas de poços profundos. Estes dados da Petrobrás estavam arquivados. A gente observou que havia muita movimentação de fluidos e resolveu aplicar um modelo analisar", explica.
Conforme a pesquisadora, a análise da vazão do fluxo mostrou que seria de bacias sedimentares na mesma extensão do rio Amazonas. "A gente nem imaginava que iria resultar nisso. Fomos analisando os dados e resultados foram estes", disse.
Por enquanto, as informações obtidas a partir das perfurações equivalem a uma extensão iniciada na bacia do Estado do Acre, passando pelo rio Solimões e Amazonas, no Estado do Amazonas, rio Marajó, passando pelas chamadas barreirinhas e vai até a foz do rio que deságua no Oceano Atlântico. Pesquisas posteriores podem identificar se este rio subterrâneo também nasce na Cordilheira dos Andes, como é o caso do rio Amazonas.
O trabalho de campo de Elizabeth começa no próximo mês, quando ela fará pesquisa nas temperaturas em poços em todos os Estados da bacia Amazônica. Os dois primeiros serão Roraima em Amazonas. Elizabeth disse que pesquisa para alcançar o rio subterrâneo exige demanda muito elevada de recursos financeiros e, no momento, não será possível de ser realizada.
publicado em A Crítica
Manaus, 25 de Agosto de 2011
Pesquisadora do rio subterrâneo planeja mapear toda a bacia amazônica
Elizabeth Pimentel (com os pesquisadores Fábio P. Vieira e Valiya Hamza em atividade de medição de propriedades térmicas de rochas das bacias sedimentares ) esteve no Amazonas na semana passada realizando análises de temperatura em poços artesianos
Autora de um estudo que apresentou indícios de um fluxo subterrâneo de água ainda desconhecido na Amazônia, a pesquisadora Elizabeth Pimentel esteve no Amazonas (Manaus e Presidente Figueiredo) e em Roraima no final de setembro, para realizar trabalho de campos em poços da região.
A pesquisadora, que faz doutorado no Observatório Nacional, no Rio de Janeiro, planeja agora voltar ao Amazonas para fazer as pesquisas de campo em outros municípios como Coari, Santa Izabel do Rio Negro e Benjamim Constant.
“A próxima etapa por enquanto será continuar o trabalho de perfilagens até mapear toda a região Amazônica, principalmente a área das bacias sedimentares. Isso envolverá os outros estados da região Norte”, explicou a pesquisadora da Universidade Federal do Amazonas (Ufam).
Na primeira etapa do estudo, ela esteve no Amazonas (Manaus e Presidente Figueiredo) e em Roraima no final de setembro, para realizar trabalho de campo em poços da região, acompanhada de seu orientador, Valiya M. Hamza.
O objetivo foi reforçar a presença do fluxo de água a partir da medida de temperatura dos poços artesianos.
Em entrevista ao portal acritica.com, a pesquisadora conta que foram realizadas perfilagens (medida de temperatura) em 13 poços de até 220 metros de profundidade, além de medidas de condutividade térmica em amostras específicas das formações rochosas que compõem as bacias sedimentares.
Poços
Em Manaus, as medidas foram realizadas em poços da empresa Águas do Amazonas instalados nas zonas Norte e Leste.
Os poços pesquisadores estão longe da profundidade dos poços perfurados pela Petrobrás na época em que a empresa procurava petróleo na região amazônica. Mas, segundo Elizabeth, eles são adequadas para os estudos.
“Os poços não atingem a profundidade dos perfurados pela Petrobrás mas foram identificados infiltrações de água na vertical no sentido para baixo. A ideia é que essa análise venha reafirmar a penetração de água. Mas vou aproveitar estes dados para várias coisas. Tentar ver se a crosta está aquecendo ou esfriando, já que a pesquisa tem como principal objetivo fazer a avaliação da variação da temperatura com a profundidade”, explicou.
Em Roraima, o trabalho foi realizado na Companhia de Águas e Esgoto de Roraima, com apoio da Universidade Federal daquele Estado. Em Presidente Figueiredo, as análises foram realizadas no Serviço Autônomo de Água e Esgoto.
Parintins
As pesquisas de campo, segundo Elizabeth Pimentel, são necessárias para obtenção de dados experimentais e é a partir delas que será possível fazer as análises e chegar a alguma conclusão.
“No projeto de doutorado será utilizado apenas o método geotérmico, até porque ainda tenho vários objetivos para alcançar. Porém em fases posteriores será possível utilizar outros métodos que possam auxiliar na identificação do fluxo subterrâneo, como por exemplo, o método magnetotelúrico que é baseado nas variações do campo magnético terrestre com o tempo o qual induz fluxo de corrente na Terra”, explicou.
O “rio” subterrâneo debaixo do rio Amazonas identificado pela pesquisadora Elizabeth Pimentel, da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) recebeu um novo nome: rio Hamza Parintins, em referência à cidade natal de Elizabeth.
Hamza é referência ao orientador de Elizabeth, Valiya M. Hamza, que também participa da pesquisa.publicado em A Crítica - 06.10.2011
Pesquisa sobre rio subterrâneo depende de novos recursos
Amazonas e Roraima, devido a facilidade de acesso, serão os primeiros Estados a terem a temperatura e a condutividade térmica dos poços analisadas.
A falta de verba para dar continuidade ao estudo que aponta indícios da existência de um rio subterrâneo de cerca de 6 mil quilômetros de extensão embaixo do Rio Amazonas já vem limitando os trabalhos desenvolvidos pelos pesquisadores do Observatório Nacional (ON), instituição onde a pesquisa é realizada.
De acordo com a geofísica, pesquisadora da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) e doutoranda Elizabeth Tavares Pimentel, responsável pela descoberta, o deslocamento a campo para medir a temperatura dos poços de todos os Estados da Bacia Amazônica precisará ser breve, em sua fase inicial.
“Tivemos financiamento da Fapeam (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas) até agora, mas o dinheiro acabou. Infelizmente a segunda fase da atividade de campo está suspensa até conseguirmos mais recursos financeiros”, explica.
Amazonas e Roraima, devido a facilidade de acesso, serão os primeiros Estados a terem a temperatura e a condutividade térmica dos poços analisadas. A atividade, financiada pelo departamento de pós-graduação do ON, terá duração de oito dias, sendo três em Roraima e cinco no Amazonas.
Elizabeth afirma que para concluir a pesquisa em campo seria necessário pelo menos R$ 76 mil, dinheiro utilizado na compra de passagens e equipamentos como uma sonda importada responsável por fazer as medidas de temperatura.
“No momento estamos fazendo o que dá para fazer com os recursos disponibilizados pelo Observatório, mas a suspensão das atividades deve se manter até o ano que vem”, disse.
Após a coleta dos dados, que também deve ocorrer no Pará, Amapá, Rondônia, Acre, Mato Grosso, Tocantins e Maranhão, os pesquisadores retornam ao Observatório para analisar o material e elaborar a próxima etapa.
Um projeto solicitando apoio financeiro para o desdobramento da pesquisa de campo já foi feito, segundo a pesquisadora, ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). “O pedido está sendo analisado, mas demora”, comentou.
Dois gigantes
Comparado ao Rio Amazonas, o Rio Hamza apresenta diferenças significativas ao que se refere à vazão, largura e velocidade de escoamento.
Estima-se que a vazão do fluxo do Rio Hamza seja de 3.090 metros cúbicos por segundo, enquanto a do Rio Amazonas alcança 133 metros cúbicos no mesmo espaço de tempo. Mesmo assim, a vazão do rio subterrâneo é superior a do Rio São Francisco, de 2,8 mil metros cúbicos por segundo.
A largura do Rio Hamza varia de 200 a 400 quilômetros contra a de 1 a 100 quilômetros do Rio Amazonas. Já nas velocidades o recém-descoberto é modesto, com uma faixa de 10 a 100 metros por ano. As do Rio Amazonas variam de 0,1 a 2 metros por segundo, conforme as condições hidrológicas locais.
Mapeamento é orientado por temperatura de poços
O estudo, responsável pela identificação da existência de um rio subterrâneo de 6 mil quilômetros de extensão a 4 mil metros de profundidade, embaixo do Rio Amazonas, foi iniciado em março do ano passado e tem como base a análise de dados de temperaturas de 241 poços profundos perfurados pela Petrobras, nas décadas de 1970 e 1980, na Região Amazônica.
A área estudada abrange bacias sedimentares do Estado do Acre, Rio Solimões, Estado do Amazonas, Marajó e Barreirinhas. A metodologia utilizada apoia-se na identificação de sinais térmicos específicos de movimentos de fluidos em meios porosos.
Observações feitas pela pesquisadora Elizabeth dão conta de que o fluxo das águas do rio, batizado de Hamza, em homenagem ao orientador da pesquisa, seja predominantemente vertical até os 2 mil metros de profundidade, havendo logo após esse nível uma modificação quase horizontal.
Com a descoberta é possível afirmar que a Região Amazônica conta com dois sistemas de descarga de fluidos: a drenagem fluvial na superfície, que constitui o Rio Amazonas, e o fluxo oculto das águas subterrâneas por meio das camadas sedimentares profundas.
Descoberta tem peso internacional
A pró-reitora de pesquisa e pós-graduação da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), Selma Bassal, afirma que não será difícil conseguir financiamento para o prosseguimento da pesquisa, uma vez que a descoberta tem relevância nacional.
“O caminho é documentar o pedido de recursos junto ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) via edital”, explicou.
Segundo ela, mesmo a universidade não podendo ajudar financeiramente o trabalho, todos os laboratórios da instituição estão à disposição dos pesquisadores, caso seja necessário.
Entre as instituições que podem fornecer recursos para a pesquisa, segundo Selma, estão o Ministério da Ciência e Tecnologia, a Capes, o Ministério da Saúde, a Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa) e até mesmo a Petrobras, que forneceu dados obtidos nas décadas de 70 e 80 quando buscava petróleo e que foram utilizados no estudo.
Em carta oficial enviada, no dia 23 de março deste ano, à pesquisadora e ao seu orientador, Valiya Mannathal Hamza, a Fapeam indeferiu o pedido de recursos para a viabilização e execução do trabalho, considerando “que esta FAP não dispõe de recursos para atender a demanda solicitada”.
A Fundação ressaltou ainda “que o valor diferenciado da bolsa concedida aos bolsistas do programa em referência justifica-se pelo mecanismo que esta Fundação utiliza para auxiliar nas despesas das atividades do desenvolvimento do projeto”.
O Departamento de Análise de Projetos (DEAP), da Fapeam, informou que um dos critérios para a liberação de recursos voltados a pesquisa é a análise do projeto e do seu prazo de execução.
publicado no Diário do Amazonas - 30.08.2011
Cientistas anunciam rio subterrâneo de 6 mil km em baixo do Rio Amazonas
O dados do doutorado de Elizabeth, sob orientação de Hamza, foram apresentados na semana passada no 12.º Congresso Internacional da Sociedade Brasileira de Geofísica, no Rio.
Em homenagem ao orientador, um pesquisador indiano que vive no Brasil desde 1974, os cientistas batizaram o fluxo subterrâneo de Rio Hamza.
Características. A vazão média do Rio Amazonas é estimada em 133 mil metros cúbicos de água por segundo (m3/s). O fluxo subterrâneo contém apenas 2% desse volume com uma vazão de 3 mil m3/s - maior que a do Rio São Francisco, que corta Minas e o Nordeste e beneficia 13 milhões de pessoas, de 2,7 mil m3/s. Para se ter uma ideia da força do Hamza, quando a calha do Rio Tietê, em São Paulo, está cheia, a vazão alcança pouco mais de 1 mil m3/s.
As diferenças entre o Amazonas e o Hamza também são significativas quando se compara a largura e a velocidade do curso d"água dos dois rios. Enquanto as margens do Amazonas distam de 1 a 100 quilômetros, a largura do rio subterrâneo varia de 200 a 400 quilômetros. Por outro lado, a s águas do Amazonas correm de 0,1 a 2 metros por segundo, dependendo do local. Embaixo da terra, a velocidade é muito menor: de 10 a 100 metros por ano (mais informações nesta página).
Há uma explicação simples para a lentidão subterrânea. Na superfície, a água movimenta-se sobre a calha do rio, como um líquido que escorre sobre a superfície. Nas profundezas, não há um túnel por onde a água possa correr. Ela vence pouco a pouco a resistência de sedimentos que atuam como uma gigantesca esponja: o líquido caminha pelos poros da rocha rumo ao mar.
Temperatura. Hamza e Elizabeth apontam a existência do que os pesquisadores chamam de "dois grandes sistemas de descargas de fluidos na Amazônia": o Rio Amazonas, com seus 6.100 km de extensão, e o fluxo oculto das águas subterrâneas.
Segundo os dados apresentados por Elizabeth, o fluxo subterrâneo é praticamente vertical - de cima para baixo - nos primeiros 2 mil metros. Depois, nas camadas mais profundas, muda de direção, tornando-se quase horizontal. Depois de atravessar as bacias do Solimões, Amazonas e Marajó, o rio alcança o fundo do mar, perto da foz do Amazonas.
Hamza argumenta que as descargas do fluxo subterrâneo de água doce poderiam explicar os bolsões de baixa salinidade comuns no litoral da região.
O geólogo Olivar Lima, da Universidade Federal da Bahia, assistiu à apresentação do trabalho e, na ocasião, mostrou aos autores mais dados, obtidos em outros poços perfurados pela Petrobrás na foz do Amazonas, que confirmam as conclusões do estudo. Porém, acha um exagero classificar a descoberta como um rio.
"Os resultados são muito bons", afirma Lima. "Só não acho correto propor a existência de um rio subterrâneo." Ele argumenta que os dados permitem afirmar a existência de um imenso fluxo de água através das formações permeáveis da Bacia Amazônica. Mas a velocidade seria muito baixa para justificar a categoria de rio.
Contudo, se por um lado a velocidade não se compara à de um rio convencional, o volume de água assume ordens de grandeza que tornariam compreensível tal comparação, reconhece o pesquisador.
A descoberta, por enquanto, não mudará a vida das populações que habitam a Bacia Amazônica. Como o rio está a uma profundidade muito grande e há muita água doce na superfície, não seria economicamente razoável perfurar a terra para acessar o curso d"água. O estudo pode ajudar, no entanto, a prospecção de petróleo.
PARA LEMBRAR
Há dois anos, cientistas italianos descobriram um rio subterrâneo que corre embaixo de Roma, mais extenso que o Tibre - o terceiro maior da Itália, com 392 quilômetros. Assim como o brasileiro, o rio subterrâneo italiano foi encontrado graças a dados de perfuração de poços.
No Brasil, outra reserva de água subterrânea é o Aquífero Guarani, com 45 milhões de litros. A maior parte fica no Brasil, mas ele também se estende no Paraguai, Uruguai e Argentina.
publicado no Estado de S. Paulo - 25.08.2011
Novo rio subterrâneo na Amazônia pode ser o maior do Mundo
Indícios da existência de um rio subterrâneo, com a mesma extensão do Rio Amazonas, que estaria a 4 mil metros abaixo da maior bacia hidrográfica do mundo, foram divulgados neste mês em um estudo realizado por pesquisadores da Coordenação de Geofísica do Observatório Nacional (ON), no Rio de Janeiro.
O Rio Hamza nasce no Peru, na Cordilheira dos Andes, mesma região que o Rio Amazonas. “Essa linha de água permanece subterrânea desde sua nascente, só que não tão distante da superfície. Tanto que temos relatos de povoados daquele país, instalados na região de Cuzco, que utilizam este rio para agricultura. Eles sabem desse fluxo debaixo de terrenos áridos e por isso fazem escavações para poços ou mesmo plantações”, afirmou o pesquisador do pesquisador indiano Valiya Hamza do Observatório Nacional.
O fluxo da água deste rio segue na vertical, sendo drenado da superfície até dois mil metros de profundidade. Depois, próximo à região do Acre, o curso fica na horizontal e segue o percurso do Rio Amazonas, no sentido oeste para o leste, passando pelas bacias de Solimões, Amazonas e Marajó, até adentrar no Oceano.
“A água do Hamza segue até 150 km dentro do Atlântico e diminui os níveis de salinidade do mar. É possível identificar este fenômeno devido aos sedimentos que são encontrados na água, característicos de água doce, além da vida marinha existente, com peixes que não sobreviveriam em ambiente de água salgada”, disse.
Características – A descoberta é fruto do trabalho de doutorado de Elizabeth Pimentel, coordenado por Hamza. Ela indica que o rio teria 6 mil km de comprimento e entraria no Oceano Atlântico pela mesma foz, que vai do Amapá até o Pará. A descoberta foi feita a partir da análise de temperatura de 241 poços profundos perfurados pela Petrobras nas décadas de 1970 e 1980.
“A temperatura no solo é de 24 graus Celsius constantes. Entretanto, quando ocorre a entrada da água, há uma queda de até 5 graus Celsius. Foi a partir deste ponto que começamos a desenvolver nosso estudo. Este pode ser o maior rio subterrâneo do mundo”, afirma Hamza.
“Não é um aquífero, que é uma reserva de água sem movimentação. Nós percebemos movimentação de água, ainda que lenta, pelos sedimentos”, disse o pesquisador cujo sobrenome batizou o novo rio.
De uma ponta a outra – Apesar de ser um rio subterrâneo, sua vazão (quantidade de água jorrada por segundo) é maior que a do Rio São Francisco, que corta o Nordeste brasileiro. Enquanto o Hamza tem vazão de 3,1 mil m³/s, a do Rio São Francisco é 2,7 mil m³/s. Mas nenhuma das duas se compara a do rio Amazonas, com 133 mil m³/s.
“A velocidade de curso do Hamza é menor também, porque o fluxo de água tem que vencer as rochas existentes há quatro mil metros de profundidade. Enquanto o Amazonas corre a 2 metros por segundo, a velocidade do fluxo subterrâneo é de 100 metros por ano.
Outro número que chama atenção é a distância entre as margens do Hamza, que alcançam até 400 km de uma borda a outra, uma distância semelhante entre as cidades de São Paulo e o Rio de Janeiro.
“Vamos continuar nossa pesquisa, porque nossa base de dados precisa ser melhorada. A partir de setembro vamos buscar informações sobre a temperatura no interior terrestre em Manaus (AM) e em Rondônia. Assim vamos determinar a velocidade exata do curso da água”, complementa o pesquisador do Observatório Nacional.
fonte: Eduardo Carvalho/ Globo Natureza
Rio subterrâneo na Amazônia divide comunidade científica
Cientistas brasileiros afirmam ter descoberto rio subterrâneo de 6 mil quilômetros, mas afirmação é contestada por geólogo da Petrobras
Cientistas no Brasil afirmam ter descoberto um enorme rio de 600 km correndo sob a Bacia Amazônica, mas outros cientistas acreditam que se trate apenas de água correndo entre as rochas subterrâneas. Desde a “descoberta” do Rio Hamza, apresentada por cientistas brasileiros no Observatório nacional na semana passada, pesquisadores ao redor do mundo agora se perguntam se viram apenas parte da Amazônia, uma região conhecida por sua rica biodiversidade e sua beleza.
Elizabeth Tavares Pimentel e Valiya Hamza encontraram o rio coletando amostras de variações de temperatura em 241 poços abandonados perfurados na Amazônia pela Petrobras nos anos 1970 e 1980. Se o rio, localizado entre dois ou quatro quilômetros abaixo da superfície, for tão grande quanto os cientistas acreditam, o Hamza pode ser revelar o maior rio subterrâneo do mundo.
“É fascinante do ponto de vista científico”, diz Michael Coe, líder do Programa da Amazônia no centro de pesquisa Woods Hole nos Estados Unidos, que estudou a região por 12 anos. “Há mais coisa acontecendo do que vemos sobre a superfície”.
Embora enorme em tamanho, o rio subterrâneo provavelmente concentra menos de 3% da água que corre pelo Rio Amazonas, diz Coe. “Não se trata de um rio nos sentido de água correndo por um tubo, mas sim de água fluindo por rochas porosas. A maior parte da água ainda está na superfície”.
Jorge Figueiredo, um geólogo da Petrobras com longa experiência na Amazônia desdenha das afirmações de que a concentração subterrânea de água poderia ser considerada um rio. “Os autores do estudo chegaram a essa conclusão com base na temperatura das rochas, mas temos dados que apontam contra essa possibilidade”. Ele não acredita que a descoberta tenha bases científicas. O estudo surgiu de uma apresentação em uma conferência, e não foi analisado por outros cientistas em publicações da área. “Parece bobagem”, diz Figueiredo. A variação da temperatura, uma importante parte da teoria dos pesquisadores “pode ser fruto de vários diferentes fatores”, afirma.
O Rio Hamza pode ser enorme, mas a água que corre por ele se move devagar. Cerca de 133 mil m³ de água correm pela Amazônia a cada segundo, enquanto o fluxo do rio subterrâneo foi estimado em 3900 m³/s. Já em largura, o Amazonas pode chegar a 100 km, enquanto o Hamza tem uma largura entre 200 e 400 km. Mas o tamanho do rio indica que ele dificilmente mantém um fluxo contínuo, diz Figueiredo.
Seis mil quilômetros (o aparente tamanho do rio) é quase a largura completa da América do Sul”, disse Figueiredo à Al Jazeera. As formações rochosas subterrâneas não são inteiramente conectadas, o que diminui as possibilidades de um rio contínuo. O geólogo não acredita que a água subterrânea deva ser considerada um rio.
Cientistas ainda não sabem precisar o que a descoberta significa para questões ecológicas mais amplas. “Essa descoberta poderia contribuir para desacelerar a salinização dos ambientes próximos ao litoral”, diz Coe. Se a água é fresca, como afirmam alguns cientistas, isso poderia afetar os ecossistemas litorâneos como manguezais e marismas.
Figueiredo não acredita que é impossível que água fresca estivesse a uma profundidade tão grande. Provavelmente, bactérias e outros pequenos organismos seriam as únicas formas de vida capazes de sobreviver na águas a essa profundidade, diz Coe.
Na pior das hipóteses, a descoberta ressalta a existência de vários recursos naturais desconhecidos na Amazônia, diz Rafael Cruz, um ativista do Greenpeace no Brasil. “A comunidade científica irá se pronunciar a respeito dessa nova descoberta, e isso será importante nas discussões sobre preservação”.
* via Era da Água - 31.08.2011
texto traduzido e adaptado pelo Opinião e Notícia
publicado na Al Jazeera – “‘Huge underground river’ found below Amazon”
Cientistas duvidam da existência de rio subterrâneo na Amazônia
Geólogos divulgam carta aberta em que criticam e colocam em dúvida as conclusões de recente pesquisa brasileira que aponta a descoberta de um rio subterrâneo debaixo do Amazonas.
Pesquisadores brasileiros divulgam indícios da existência de um ‘rio’ 4 mil metros abaixo do rio Amazonas, mas geólogos da Febrageo criticam a pesquisa e a terminologia escolhida para o fluxo de água.
“Descoberto rio subterrâneo de 6 mil km debaixo do rio Amazonas”. Ao se deparar com essa notícia, muita gente logo imaginou um caudaloso fluxo de água correndo por um túnel abaixo da terra. No entanto, o suposto rio, anunciado por pesquisadores brasileiros do Observatório Nacional, nada tem a ver com essa imagem.
Não é à toa que o estudo tem causado rebuliço no meio científico, levando um grupo de pesquisadores da Federação Brasileira de Geólogos (Febrageo) a elaborar uma carta aberta à sociedade criticando as conclusões do trabalho e o uso do termo ‘rio’.
O ‘rio’ subterrâneo, batizado de Hamza em homenagem a um dos seus descobridores, o geólogo Valiya Hamza, foi anunciado no final de agosto no 12º Congresso Internacional da Sociedade Brasileira de Geofísica, chamando a atenção da mídia internacional e conquistando até um verbete na Wikipédia.
Hamza e sua orientanda de doutorado Elizabeth Pimentel, da Universidade Federal do Amazonas, analisaram dados de temperatura da água e das rochas de 241 poços de petróleo desativados perfurados pela Petrobrás na região amazônica e encontraram indícios de que existe um fluxo de água subterrâneo, de 6 mil km de extensão e até 400 km de largura, que corre por entre os sedimentos rochosos a 4 mil metros de profundidade.
Segundo os pesquisadores, o ‘rio’, formado pela infiltração da água da chuva e de outros rios, teria início no Acre e seguiria do oeste para o leste, passando pelas bacias dos rios Solimões, Marajó e Amazonas, até alcançar o mar.
No entanto, geólogos dizem que, mesmo que exista esse fluxo de água, ele não poderia ser chamado de rio, pois se move por dentro de uma camada permeável de rochas, como o calcário e o arenito.
De acordo com o geólogo José Luiz Galvão de Mendonça do Centro Universitário de Araraquara (Uniara) – autor do artigo ‘Rios subterrâneos: mito ou realidade’ publicado na revista CH –, o fluxo de água descrito se assemelha mais a uma esponja molhada do que a um rio.
“Tratar essa água como um rio está errado”, afirma. “Um rio subterrâneo é um conceito popular; na verdade, o que foi descoberto foi um aquífero, rochas porosas que retêm água.”
Hamza conta que foi difícil definir a descoberta, mas que não seria possível chamá-la de aquífero porque o fluxo de água encontrado não fica reservado, mas segue curso e deságua do mar.
“Encontramos movimento de água que corre em área muito extensa e achamos que o melhor seria chamar de rio”, diz.
Passos de formiga
O estudo de Hamza indica que o fluxo de água subterrâneo é lento, com uma velocidade de 10 a 100 metros por ano, bem menor que a do rio Amazonas, que avança cerca de dois metros por segundo. Mas, de acordo com o pesquisador, isso não é motivo para não chamá-lo de rio.
“Não há definição na ciência para a velocidade mínima ou máxima de um rio”, diz. “Inclusive, no Brasil, existem rios com velocidade inferior a que encontramos, como o Rio do Sono, no Tocantins. Além disso, o nosso rio tem um fluxo de 3.900 m3/s, muito grande se comparado ao do Rio São Francisco, por exemplo.”
Hamza: “Não há definição na ciência para a velocidade mínima ou máxima de um rio”
Na avaliação do pesquisador, o uso do termo rio é adequado, pois, além do rio a que estamos acostumados, que corre na superfície, existem outros dois tipos conhecidos: o atmosférico e o subterrâneo.
Celso Dal Ré Carneiro, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), um dos geólogos que assinam a carta aberta de crítica ao estudo, confronta a análise de Hamza. Ele afirma que ‘rio atmosférico’ não é um termo científico e que o conceito de ‘rio subterrâneo’ é usado apenas para as situações em que águas fluem dentro de cavernas.
“Chamar de rio o fluxo de água indicado no estudo é o mesmo que dizer que uma caneta que tem forma de lápis é um lápis e não uma caneta. Esse estudo fere conceitos arraigados nas geociências.”
Carneiro e os demais geólogos que assinam a carta destacam que fluxos de água lentos como o indicado por Hamza “são comuns na região do rio Amazonas e estudados há tempos pelos geólogos brasileiros”.
Conclusões precipitadas
De acordo com Hamza, uma das principais implicações da descoberta do ‘rio subterrâneo’ é a explicação que ele traz para a presença de bolsões de baixa salinidade na zona oceânica em torno da foz do Rio Amazonas.
Segundo o pesquisador, a baixa salinidade dessa região, que resulta em uma fauna única, não poderia ser causada somente pelas águas doces do Amazonas.
Essa tese é confrontada pelos geólogos da Febrageo. Segundo eles, a descarga do Amazonas é sim suficiente para formar os bolsões de água doce no Atlântico e não há como afirmar que o fluxo de água descoberto chega ao oceano e nem mesmo se ele é de fato doce.
“É muita suposição dizer que esse fluxo deságua no mar, bem como especular sobre sua velocidade, vazão e dimensão”, defende Carneiro. “O trabalho como um todo não é absurdo, mas as suas conclusões são precipitadas, baseadas apenas em dados indiretos de temperaturas que não foram avaliados por pesquisadores independentes.”
publicado na Voz do Acre - 24.09.2011
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