A aprovação do novo Código Florestal, prevista para esta semana, deve levar à suspensão de três em cada quatro multas acima de R$ 1 milhão impostas pelo Ibama por desmatamento ilegal.
A Folha obteve a lista sigilosa e atualizada das 150 maiores multas do tipo expedidas pelo órgão ambiental e separou as 139 que superam R$ 1 milhão. Dessas, 103 (ou pouco menos que 75%) serão suspensas se mantido na Câmara o texto do código aprovado no Senado. Depois, ele segue para a sanção da presidente Dilma Rousseff.
Pelo texto, serão perdoadas todas as multas aplicadas até 22 de julho de 2008, desde que seus responsáveis se cadastrem num programa de regularização ambiental. As punições aplicadas depois disso continuarão a valer.
Para conseguir o perdão, o produtor terá três alternativas: recompor a reserva legal (metade da área pode ser com espécies exóticas), permitir a regeneração natural ou comprar área de vegetação nativa de mesmo tamanho e bioma do terreno desmatado.
As multas milionárias que devem ser anistiadas somam R$ 492 milhões (60% do total das multas acima de R$ 1 milhão) e se referem à destruição de 333 mil hectares de vegetação -equivalente a duas cidades de São Paulo.
Quando contadas as multas de todos os valores, a anistia chega a R$ 8,4 bilhões. A maioria das infrações milionárias foi aplicada pelo Ibama entre 2006 e 2008. Nenhuma foi paga até hoje.
Ao menos 48 desses produtores também respondem a processos judiciais por crimes contra o ambiente. A punição a esses crimes deverá ser extinta. Dez foram processados também por manter trabalhadores em condições análogas à de escravo.
A maior parte dos infratores é dona de fazendas e de empresas agropecuárias, mas há também ligados a madeireira, agroindústria, frigorifico, curtume, imobiliária e posto de gasolina.
Só os dez maiores desmatadores destruíram 98 mil hectares e receberam multas no valor de R$ 166 milhões. O maior, Léo Andrade Gomes, do Pará, sofreu infrações que somam R$ 32,2 milhões. Derrubou 15 mil hectares de florestas, ou 150 km².
O ex-deputado federal Ernandes Amorim (PTB-RO) foi multado em R$ 2,4 milhões por danos ambientais numa área de 1.600 hectares.
A infração de maior valor da lista de 150, R$ 23,3 milhões, foi aplicada à agropecuária Santa Bárbara Xinguara, em São Félix do Xingu (PA), que tem o empresário Daniel Dantas como acionista e investidor. Mas essa não poderá ser perdoada porque a autuação ocorreu em 2010.
Auditores do Ibama e procuradores federais avaliam que a anistia vai atrasar ainda mais os processos administrativos e judiciais, além de sinalizar a impunidade, estimulando novos crimes.
A ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva afirma que o novo código "promove a anistia dos grandes desmatadores, reduz a proteção do meio ambiente e vai aumentar o desmatamento". "Quem desmatou mais será favorecido porque suas propriedades estão mais valorizadas."
O presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, deputado Moreira Mendes (PPS-RO), defende o modelo de anistia proposto. "Há 20 anos, não havia preocupação com o ambiente. Seguíamos a tradição dos nossos pais. Essa preocupação evoluiu muito. Mas temos que considerar a situação de fato e fazer a transição. O que está feito, está feito."
Quem desmata não é bandido, afirma produtor
A Folha tentou contato com os dez maiores desmatadores, mas a maioria estava incomunicável em suas fazendas. Não houve resposta aos recados deixados.
O produtor Mário Luiz Breda destruiu 8,3 mil hectares de floresta objeto de especial preservação, em janeiro de 2007, e recebeu três multas no valor de R$ 12,4 milhões.
Ele aguarda pela anistia e reclama do tratamento que a sua classe bem recebendo: "Não é porque a gente é desmatador que é bandido. Nós somos todos trabalhadores, mas viramos marginal da noite para o dia", diz.
Olivier Vieira recebeu multa de R$ 17,7 milhões por desmatar 3,5 mil hectares em São José do Xingu (MT), no Nordeste do Estado. Disse que não se lembrava: "Sou só um pequeno sócio nessa empresa. Não cuido dessa parte".
Décio Aquino Rosa desmatou 5,5 mil hectares em Cumaru do Norte (PA) e recebeu multas no total de R$ 15,1 milhões em 2007 e 2008. A União tenta recuperar R$ 19,9 milhões por via judicial. Na Justiça, disse que foi obrigado a desmatar porque a área estaria em "conflito agrário".
A Santa Bárbara afirma que houve equívoco do Ibama na aplicação das multas. "Algumas se referem a áreas que sequer são da empresa, outras dizem respeito a áreas que, devidamente autorizadas, passaram pelo processo de limpezas de pasto", diz nota da empresa.
publicado na Folha de S. Paulo em 05/03/2012
Cf. também: Dossier sobre Multas Ambientais
Novo Código Florestal anistia multas dos doadores de 50 políticos
Empresas que poderão ter multas ambientais suspensas com a aprovação do novo Código Florestal contribuíram no ano passado com cerca de R$ 15 milhões para financiar a campanha de 50 congressistas que participaram das discussões do projeto no Congresso nos últimos meses.
É o que revela cruzamento de autos de infração do Ibama com as doações eleitorais contabilizadas pelos partidos. As contribuições foram feitas no pleito de 2010, quando a reforma do código já estava em discussão na Câmara. O valor é 42% maior que o total doado pelas mesmas empresas na eleição de 2006.
As empresas foram autuadas, num total de R$ 1,6 milhão, por irregularidades como destruir vegetação nativa, áreas de preservação permanente, e consumir carvão de mata nativa. Algumas também receberam multas impostas pela Justiça.
O Senado Federal aprovou ontem à noite o projeto do novo Código Florestal. Com a nova lei, as empresas que aderirem a programas de regularização ambiental terão suas multas suspensas e convertidas em serviços de recuperação ambiental.
Entre os senadores que receberam dinheiro dessas empresas e agora participam dos debates sobre a norma estão Ricardo Ferraço (PMDB-ES), Wellington Dias (PT-PI) e Delcídio Amaral (PT-MS).
Dos deputados, quase todos apoiaram as mudanças no Código. Luiz Carlos Heinze (PP-SC), que recebeu R$ 150 mil da SLC Agrícola, declarou que não está defendendo "criminosos".
Governadores, que têm grande influência sobre as bancadas estaduais, levaram R$ 4 milhões. Jaques Wagner (PT-BA) e Renato Casagrande (PSB-ES) ficaram com as maiores quantias.
As indústrias de celulose ficaram entre as maiores doadoras do grupo. A Fibria, que tem multas de R$ 946 mil pendentes no Ibama, deu R$ 4,7 milhões às campanhas. Ela tem ainda 50% das ações da Veracel Celulose, multada pela Justiça em R$ 20 milhões e em R$ 390 mil pelo Ibama.
O senador Dias recebeu R$ 150 mil da Suzano Celulose, mas não vê conflito de interesse nesse caso: "Seria muito pequeno um parlamentar colocar o mandato a serviço de interesses individuais de uma empresa". Ele disse que a empresa investirá R$ 6 bilhões numa fábrica no Piauí.
Delcídio Amaral disse que as doações foram feitas legalmente e que "não se pode condenar previamente a empresa". Por sua vez, Ferraço recebeu R$ 150 mil da Fibria, mas rejeita a suspensão.
Empresas dizem que as doações são todas legais
A Fibria diz que não comenta processos em curso. Afirma que suas atividades estão devidamente regulares e que faz doações legais "observando as melhores práticas de ética e transparência".
A Suzano diz que as infrações estão relacionadas ao furto de madeira por terceiros. Os argumentos da empresa estão aguardando "análise jurídica para serem encaminhados para decisão".
A SLC alega que vai provar que a vegetação não foi suprimida após o período de validade da autorização de desmate, como afirma o Ibama. A Bedin Agropecuária nega ser dona do imóvel referente ao processo e por isso não pagou a multa e recorreu.
A MMX diz que a multa não se enquadra nas normas que permitem o cancelamento da pena e que tentará um acordo com o Ibama. A Ultrafertil e Guidoni não comentaram.
publicado na Folha de S. Paulo em 07/12/2011
Relatório mostra que menos de 1% das multas aplicadas pelo Ibama são pagas
Menos de 1% do valor das multas aplicadas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) por infrações ambientais chegam efetivamente aos cofres públicos, aponta relatório do próprio órgão obtido pelo Estado. O documento traz um panorama das autuações feitas entre 2005 e 2010. O porcentual médio de multas pagas no período foi de 0,75%. No ano passado, o índice foi ainda menor - apenas 0,2%.
Os dados mostram ainda que o número de multas aplicadas caiu 42% no período - de 32.577 multas em 2005 para 18.686 em 2010, bem como os valores relacionados a essas multas. A maior parte das autuações está associada a crimes contra a flora, o que inclui desmatamentos, queimadas e venda de madeira ilegal.
Há ainda Estados com autuações bilionárias. É o caso do Pará, que desde 2005 encabeça a lista de recordistas em multas por infrações ambientais. Só em 2010, o valor das autuações soma R$ 1,02 bilhão. Mato Grosso vem em segundo lugar, com R$ 376,5 milhões em 2010.
O baixo porcentual de multas efetivamente pagas reflete, segundo o próprio Ibama e especialistas, a complexa tramitação dos processos de apuração de infrações ambientais. "O processo administrativo de apuração de infração ambiental não tem o poder de, per si, garantir o pagamento de multa", explicou o Ibama em nota ao Estado.
A legislação atual prevê a inscrição de devedores no Cadastro Informativo de Créditos não Quitados do Setor Público Federal (Cadin) e a inscrição de débitos na Dívida Ativa da União, em procedimento de execução fiscal exercido pela Advocacia-Geral da União. Para chegar a tanto, o processo passa por duas instâncias de julgamento. Antes de 2009 - quando deixou de existir a possibilidade de recurso final ao Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) - os processos chegavam a voltar até oito vezes ao órgão ambiental.
Por outro lado, segundo o Ibama, os processos de autos de infração referentes aos crimes de desmatamento são de tramitação mais complexa, pois envolvem altos valores de multas e frequentemente são contestados na Justiça. "Esses processos refletem também a ordenação fundiária da Amazônia Legal, com implicações na confirmação de autoria da infração ambiental", afirma a autarquia.
publicado no Estadão em 11/04/2011
Ibama aplica multas milionárias, mas pouco consegue receber
O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) aplica multas num valor total de milhões de reais todos os anos, a maior parte por desmatamento ilegal na Amazônia. Mas pouca gente paga. A arrecadação está longe do volume de autuações feitas pela área de fiscalização. O resultado é um passivo de R$ 10 bilhões, o equivalente a 10 orçamentos anuais da autarquia.
Isso é consequência da demora no andamento dos processos, que se arrastam por até oito, nove anos. Para tentar melhorar a arrecadação, a atual diretoria do Ibama promoveu uma reestruturação interna, contestada por parte dos servidores. O resultado foi uma pequena queda na arrecadação neste ano.
O Ibama vinha progredindo no volume de arrecadação nos últimos anos. Em 2002, último ano do governo Fernando Henrique Cardoso, foram recuperados apenas R$ 3,2 milhões. No ano seguinte, o valor mais que dobrou: R$ 7,2 milhões. Alcançou R$ 25 milhões em 2005. No ano passado, foram R$ 54 milhões. Com a nova estrutura, a arrecadação atingiu R$ 42 milhões até outubro. Deve fechar o ano no máximo em R$ 50 milhões. A maior parte desse volume de infrações ocorre nos estados do Pará, Mato Grosso e Rondônia. A procuradora-geral do Ibama, Andrea Vulcanis, afirma que essa redução já era prevista. “A gente tem que trocar o pneu com o carro andando”, justifica. Mas ela garante que haverá uma recuperação a partir do próximo ano.
Servidores de carreira do Ibama afirmaram ao Correio que há uma completa paralisação na cobrança dos autos de infração com a edição da Instrução Normativa 14/09, o que teria provocado excessiva queda na arrecadação. Segundo eles, essa instrução desonera os procuradores de atribuições e esvazia os segmentos técnicos, com a formação de novas equipes que passam a ser responsáveis pelas atribuições anteriormente exercidas pelos procuradores.
A presidente-substituta do Ibama, Sandra Klosovski, disse que a nova instrução veio para “solucionar esse passivo e dar celeridade daqui para frente aos processos que entram. Nós tínhamos superintendências com 11 mil processos, cinco mil processos”. Segundo ela, havia um desvio de procuradores para trabalho em área técnica. “Eles deixavam de fazer o trabalho jurídico. Então, não quer dizer que o procurador está alijado. Ele não faz mais os trabalhos técnicos, faz análise e julgamento legal”, explica a presidente-substituta. “Existe uma certa resistência na Casa para assumir esse trabalho, mas, se não assumirem, não vamos revolver nunca, porque isso não é o papel do jurídico.”
Reestruturação
Vulcanis afirma que o Ibama está passando por um processo de reestruturação nas áreas de fiscalização e arrecadação de autos de infração. “Em 2007, começamos a discutir a revisão das normas. O decreto anterior não respondia a uma série de questões de caráter ambiental, especialmente quanto à apuração das infrações. Nós tínhamos quatro instâncias recursais. Esses processos estavam demorando oito, nove anos para ser julgados. Depois, ainda iam à Justiça. Era um processo lento, ineficaz. Na verdade, as pessoas só pagavam as multas quando precisavam conseguir alguma licença. Era quase que um pagamento voluntário”.
A procuradora-geral diz que os processos iam parar na Procuradoria e, ali, se acumulavam, diante de poucos procuradores. “Hoje, lavrou um auto de infração, todo o procedimento é passado por uma análise técnica, onde o sistema de informação está todo preparado. Todo esse processo técnico que antes fica sob a responsabilidade da procuradoria passou para a própria autarquia resolver.”
Questionada porque a arrecadação caiu justamente no ano da mudança, respondeu: “Você não pode parar de apurar as licitações e ao mesmo tempo tem que montar os sistemas internos, treinar equipes. Isso tudo gera um impacto. Mas o trabalho paralisou? Não, não paralisou”. Mas ela não esconde os problemas: “A arrecadação aumentou muito, mas ainda fica muito longe do que é lavrado pela área de fiscalização, ou seja, você apura muita infração e muito pouca gente paga. A gente agora vai ter que esperar pelo menos um ano da entrada em vigor da nova instrução para a gente saber se houve ganho nesse tempo”.
Dinheiro perdido
Embora o Ibama tenha uma fatura bilionária a receber em multas, nos últimos anos o órgão tem conseguido arrecadar muitos dos recursos devidos. Confira a evolução da arrecadação:
Ano valor
2002 R$ 3,2 milhões
2003 R$ 7,2 milhões
2004 R$ 9 milhões
2005 R$ 25 milhões
2006 R$ 28 milhões
2007 R$ 37 milhões
2008 R$ 54 milhões
2009* R$ 42 milhões
* Valor referente ao período entre janeiro e outubro
Fonte: Ibama
Peso no bolso
Os estados citados pela procuradora do Ibama estão entre os que menos desmataram, no período de agosto de 2008 a julho de 2009, segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). No caso de Mato Grosso, que vive basicamente da agropecuária, a queda foi de 65%, passando de 3.258 mil para 1.047 mil km² devastados.
Rondônia, também citada pelo Ibama, foi o estado que ficou em segundo lugar em eficácia na política de preservação: 50% a menos em relação ao mesmo período do ano passado. Já o Pará, historicamente, citado como um dos maiores desmatadores também não ficou atrás. Enquanto neste período o estado marcava 5.606 mil km² quadrados de floresta queimada, este ano a realidade mostrou que as multas do Ibama pesaram no bolso dos infratores.
A queda foi de 35%, ou 1.919 km² a menos. O resultado foi divulgado em novembro pelo governo e considerado o maior em 21 anos de monitoramento da região, passando de 12, 9 para 7 mil km², entre agosto de 2008 e julho de 2009. Em 2004, por exemplo, a devastação desenfreada chegou a consumir 27,4 mil km² de floresta.
publicado no Correio Braziliense / EcoDebate em 08/12/2009
Cf. também: Ninguém protestou contra a lei que amarrou o Ibama
Ruralista ameaça governo e comissão do Senado vota Código Florestal sem multa
Bancada do agronegócio aproveita urgência da aprovação da DRU para governo, empareda Comissão de Meio Ambiente e consegue que novo Código Florestal chegue ao plenário do Senado sem previsão de multa a desmatadores. Votação na comissão foi liquidada nesta quinta (24), sob protesto de ambientalistas. Plenário deve apreciar semana que vem.
Enquanto a norte-americana Chevron ataca o meio ambiente brasileiro com petróleo no mar, a bancada ruralista faz sua parte no Senado protegendo desmatador. Nesta quinta-feira (24), a Comissão de Meio Ambiente da Casa liquidou a votação do novo Código Florestal e, por pressão ruralista, abriu mão de multar quem devastou ilegalmente. O projeto está pronto para ser votado no plenário na semana que vem.
Foram seis horas de sessão, entreamadas com protesto de ambientalistas, que foram retirados da sala da comissão pela polícia do senado, até que se encerrasse a votação do relatório do senador Jorge Viana (PT-AC).
O texto começar a ser apreciado na véspera, com alterações negociadas momentos antes com os ruralistas. A principal delas é a conversão da multa que seria aplicada a quem desmatou até 2008 em projetos de recuperação ambiental. Na versão que Viana recebera de duas comissões do Senado, só pequenos agricultores escapavam de multa.
Na terça-feira (22), a senadora Kátia Abreu (PSD-TO), que preside a Confederação da Agricutlura e Pecuária do Brasil, aproveitou-se que acaba de chegar ao Senado a votação mais importante neste ano para a presidenta Dilma Roussef - a DRU - para liderar a chantagem. Ou Viana e o governo aceitavam o fim das multas ou a bancada ruralista iria parar todas as votações no Senado.
No dia seguinte, o relatório de Viana já acolhia a mudança, encabeçada pelo senador Luiz Henrique (PMDB-SC), que relatara o Código Florestal anteriormente, e com a assinatura de outros 15 senadores ruralistas.
O senador Lindenberg Farias (PT-RJ) chegou a pedir o adiamento da votação para que as bancadas pudessem avaliar as novas propostas, mas foi derrotado no voto. O senador Randolfe Rodrigues (PSol-AP) acusou o projeto de institucionalizar o desmatamento irregular no país. Presente à votação, a ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva disse que o texto é uma derrota para a legislação ambiental brasileira. E pregou veto de Dilma.
Histórico de polêmica
A matéria, sempre polêmica, recebeu 212 emendas desde que chegou à CMA, após ser aprovada em outras três Comissões do Senado. O relator acolheu cerca de 40 delas em seu relatório final, rejeitando as demais. A aprovação do texto base condicionou a votação dos 77 requerimentos de destaques para ser feita em separado, nesta quinta. Entretanto, cerca de 50 deles foram retirados pelos autores, negociados ou considerados superados pelos membros da Comissão.
Dos demais, quatro foram acatados. Dois se referem às emendas dos senadores Aloysio Nunes (PSDB-SP) e Blairo Maggi (PR-MT) que tratam da apuração do uso irregular de fogo em áreas públicas e particulares. Ficou devido que, na apuração das responsabilidades, deverá ser comprovado "o nexo de causalidade entre a ação do proprietário ou qualquer preposto e o dano efetivamente causado".
A terceira, também de autoria de Aloysio Nunes, impede a realização de atividades em Áreas de Preservação Permanente (APP), localizadas dentro de unidades de conservação integral, criadas até a promulgação do Novo Código. E impõe, ainda, aos proprietários a necessidade de recuperação das áreas que sofreram danos.
Nunes é também o autor da quarta emenda acolhida, que determina que entre as diversas atividades de utilidade pública e interesse social que justifiquem o desmatamento em APP, só podem ser autorizadas quando inexistir alternativa técnica.
Resquícios para o plenário
Para garantir a aprovação, o relator também teve que se comprometer a apresentar sugestões de emendas incorporando outros destaques, durante a apreciação da matéria em plenário. Uma delas incorporará emenda do senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA), que prevê a transformação da aquicultura em atividade de interesse social, priorizando a preservação dos empregos nos apicuns, as partes dos manguezais onde há promissora extração de camarões.
Outro ponto que deverá receber proposta de emenda em plenário diz respeito às bacias hidrográficas. Só que, neste caso, os ruralistas serão os autores. O texto do relator incorporou outra emenda de Aloysio Nunes que estabelece que, em bacias hidrográficas consideradas críticas, a consolidação de atividades rurais dependerá do aval do comitê de bacia hidrográfica competente ou dos conselhos estaduais do meio ambiente.
Blairo Maggi questionou esta incorporação, alegando que o poder atribuído às bacias ou conselhos quebra acordo anterior para regularização das atividades consolidadas em margens de rios. Entretanto, como o texto base já havia sido aprovado na sessão anterior, o presidente da CMA, Rodrigo Rollemberg (PSB-DF) esclareceu que novas mudanças só poderão ser propostas quando a matéria tramitar em plenário.
Apesar da polêmica, o Jorge Vianna se manifestou satisfeito com o resultado e refutou as acusações de que seu relatório concede anistia aos produtores que cometeram crimes ambientais. “É um texto muito bom para o meio ambiente, para o Brasil, e que vai dar a segurança que os produtores precisam para trabalhar dentro da lei”, afirmou.
publicado na Carta Maior em 24/11/2011
Relator admite que novo Código Florestal anistia desmatadores
O relator da reforma do Código Florestal, deputado Paulo Piau (PMDB-MG), admitiu que a proposta promove anistias para quem desmatou ilegalmente e a redução de áreas protegidas em propriedades privadas. O texto deve ser votado na Câmara nas próximas semanas.
“Nas disposições transitórias, vai haver perdas, sim. O que você está chamando de anistia. É anistia”, disse o parlamentar, ao responder a uma pergunta feita em debate ontem, na Câmara. As disposições transitórias são a parte do projeto que trata da legalização de desmatamentos irregulares realizados até 2008.
Piau negou que o projeto poderá estimular novos desmatamentos. Mas fez uma ressalva em relação ao artigo que permite a redução da Reserva Legal, de 80% para 50% da propriedade, em municípios da Amazônia que alcançarem mais de 50% de seu território ocupado por terras indígenas ou unidades de conservação. “Talvez esse seja um ponto, um dos pontos, na Amazônia, que pode ter alguma coisa em termos de desmatamento. Pode ser”, arriscou.
Defensores do agronegócio e os diversos relatores da matéria sempre negaram que a reforma significaria o perdão a quem desmatou e novos desmatamentos. A questão tornou-se importante porque, na campanha eleitoral, a presidenta Dilma Roussef comprometeu-se a vetar qualquer dispositivo que implique as duas consequências.
Rio+20
O deputado disse que o governo tem interesse em votar a matéria o quanto antes para evitar a proximidade com a conferência da ONU sobre meio ambiente que acontece em junho, no Rio de Janeiro. “Essa questão da Rio+20, essa é uma posição – vocês vão ver – até de governo. Estamos ouvindo que, por interesse do governo brasileiro, [não interessa] misturar essas duas coisas [Rio+20 e Código Florestal]”.
O governo teme que, caso a votação seja adiada, a posição do País nas discussões internacionais sobre meio ambiente, em especial na conferência, saia enfraquecida. O Brasil poderia ser acusado de promover uma lei que flexibiliza a proteção às florestas enquanto cobra de outros países mais empenho na conservação. Ruralistas receiam que a pressão force a rediscussão do projeto que está hoje na Câmara.
As afirmações de Piau foram feitas no seminário “O Código Florestal e a Ciência: o que os legisladores ainda precisam saber”, promovido pelo Comitê Brasil em Defesa das Florestas.
Um documento da assessoria do deputado obtido pela reportagem do ISA revela que seu parecer deverá resgatar alguns dos maiores retrocessos aprovados pela Câmara, no início do ano passado, e alterados pelo Senado, em dezembro. Trata-se de uma tabela que compara os textos aprovados nas duas casas e a provável nova redação proposta pelo deputado (veja o documento) (saiba mais).
Segundo o regimento, na nova votação, os deputados terão de optar, em cada um dos artigos, pela versão do Senado ou a original da Câmara. Podem ser feitas apenas emendas de redação.
Vaia
O coordenador da mesa do seminário, professor José Eli da Veiga, da USP (Universidade de São Paulo), questionou Paulo Piau se ele estaria disposto a pedir o adiamento da votação. O deputado disse que essa decisão caberia ao presidente da Câmara e assegurou que não tem pressa em apresentar seu parecer.
Pouco depois, irritou-se e foi vaiado. “O senhor não é deputado e está se metendo em coisas que são da Câmara. Quem entende de processo legislativo são os deputados, por favor. Vocês têm o direito, como sociedade, de participar de tudo. Agora, representativos somos nós, os deputados. Nós é que temos voto. Não se metam em coisas que não são suas”, disse o relator.
Apesar disso, respondendo a outra pergunta, Piau concordou que a votação poderia ser adiada para dar mais tempo a seus colegas para entender e discutir o assunto. O parlamentar informou que seu parecer estaria pronto provavelmente hoje. Ele vem se reunindo com líderes e bancadas para sondar opiniões e apresentar suas propostas.
Seminário
No seminário, foi lançada uma publicação com artigos de cientistas sobre as consequências do novo Código Florestal (veja o documento). O evento reuniu ainda parlamentares, técnicos, representantes da sociedade civil e do Ministério Público.
A tônica foi de grande descontentamento com a reforma. Os autores da publicação ressaltaram a ausência de embasamento científico e as inúmeras impropriedades conceituais dos textos já votados na Câmara e no Senado.
Eli da Veiga insistiu que o tema tem sido tratado com atropelo no Congresso. “Eu desafio algum deputado a dizer que conhece o projeto do Senado. Ele é um projeto complexo, cujos resultados podem implicar riscos imensos. O que queremos dizer, junto com nossos colegas cientistas, é que numa democracia não se pode votar um assunto dessa importância com esse afogadilho.”
Vários dos palestrantes, incluindo a ex-ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, reiteraram a opinião de que a bancada ruralista estaria usando a estratégia de carregar nas reivindicações e críticas ao projeto vindo do Senado para desgastar o governo e evitar os vetos da presidenta Dilma. Ainda assim, destacaram a preocupação de que o texto possa ser piorado na sua volta à Câmara.
publicado no ISA em 29/02/2012
Governo prorroga decreto de crimes ambientais
A presidenta Dilma Rousseff adiou nesta quinta-feira (9) a validade do decreto de crimes ambientais, que torna mais rigorosas as punições para desmatamentos ilegais e outras infrações contra o meio ambiente. O decreto, que passaria a valer a partir deste sábado (11), foi prorrogado por mais seis meses (180 dias). Essa é a terceira prorrogação da matéria.
Com a prorrogação, produtores rurais ganham um novo prazo para registrar a reserva legal de suas propriedades – áreas que devem ser preservadas, sem a possibilidade de corte raso de madeira (desmatamento). Multas e sanções para os que desmataram ilegalmente permanecem suspensas.
Em nota à imprensa, o governo afirma que a “definição da nova data atende a uma solicitação dos líderes partidários no Senado Federal, onde está em análise o projeto do Novo Código Florestal”. Na semana passada, o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), entregou à presidenta um documento com assinaturas de vários líderes de partidos reivindicando mais tempo para o debate do novo código.
O projeto do novo código, de autoria do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), foi aprovado na Câmara em maio. A matéria foi aprovada em sessão tumultuada, que dividiu a base aliada e acirrou os ânimos entre ruralistas e ambientalistas.
No Senado, líderes partidários têm adotado o discurso de tranquilidade para a votação. Aos aliados, o governo já apresentou 11 pontos que pretende alterar na Casa. O principal deles é em relação à anistia aos desmatadores, em especial em relação à dispensa de recuperar áreas de preservação permanente (APPs) degradadas.
O projeto do novo código vai ser votado nas comissões de Constituição e Justiça, de Agricultura e de Meio Ambiente. Nesta última, onde será discutido o mérito da matéria, o relator será o senador Jorge Viana (PT-AC), político ligado à ex-senadora e ministra do Meio Ambiente Marina Silva. Viana tem se pronunciado pouco em relação às mudanças que irá fazer em seu relatório, mas sinaliza na necessidade de incluir no texto incentivos econômicos para a preservação das florestas.
publicado em 09/06/201
Ipea: Código Florestal anistia 29 milhões de hectares
Em meio ao polêmico debate do novo Código Florestal no Congresso, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) divulgou nesta quarta-feira (7) um estudo técnico que aponta que o país poderá anistiar uma área de 29 milhões de hectares de vegetação nativa, se o Legislativo aprovar o projeto de lei do novo código, de autoria deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP). A proposta, que está em discussão no Senado, anistia multas por desmatamento ilegal e dispensa proprietários de terra de reflorestar áreas degradadas.
De acordo com o estudo, somente com a dispensa da recomposição de reserva legal para pequenas propriedades (com até quatro módulos fiscais), o país perderá 18 milhões de hectares de áreas de preservação na Amazônia. Segundo o estudo, se for considerada essa isenção para quatro módulos em todas as propriedades, como articula a bancada ruralista no Congresso, o passivo ambiental no país seria de 48 milhões de hectares.
“A alteração proposta no PL 1876/99 para as áreas de reserva legal impactarão significativamente sobre a área com vegetação natural existente nos biomas brasileiros e sobre os compromissos assumidos pelo Brasil para redução de emissão de carbono”, diz o estudo. “Isso indica que alternativas devem ser buscadas para viabilizar a efetiva aplicação das leis ambientais, visando conciliar o desenvolvimento econômico e a conservação ambiental no Brasil”, afirma.
Pelo estudo, o Ipea conclui que a proposta do novo código em tramitação no Congresso “pune o proprietário rural que está cumprindo a legislação atual”. A partir da análise do projeto de Aldo, o Ipea conclui que entre duas propriedades de terra com a mesma área, o terreno desmatado será mais valorizado do ponto de vista de investimentos.
“Vigorando a regra proposta pelo projeto de lei, um investidor com interesse na compra de um imóvel para exploração agropecuária preferirá o segundo imóvel, uma vez que ele estará legalmente regular e com uma área explorável maior. Se, pelo contrário, mantendo a atual legislação e efetivamente cumprindo-a, o investidor irá preferir o primeiro imóvel, uma vez que não precisará investir em recuperação”, aponta o estudo. O primeiro imóvel é aquele que preservou a reserva legal.
O posicionamento do Ipea reforça a visão de ambientalistas em relação à reforma do Código Florestal brasileiro. Na tarde de ontem (6), a presidenta Dilma Rousseff afirmou que “não haverá negociação com desmatamento” no novo código. Após intensos embates na Câmara, envolvendo racha da base aliada, o governo tenta costurar mudanças no Senado, para evitar o desgaste do veto presidencial e possíveis repercussões internacionais negativas para o país, por causa da perda de áreas preservadas.
Entre os pontos que o governo pretende modificar no Senado, estão os dispositivos que perdoam dívidas por desmatamento ilegal e anistiam os proprietários quanto à necessidade de reflorestar áreas degradadas. O governo espera também que os senadores alterem o item referente à dispensa da recomposição de reserva legal para propriedades rurais. A costura das mudanças ficará ao encargo do senador Jorge Viana (PT-AC), que será o relator da matéria na Comissão de Meio Ambiente.
publicado em 08/06/2011
# Para consultar na íntegra: Estudo do Ipea sobre o novo Código Florestal
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