Na sequência deste texto:
A marginal Tietê é, provavelmente, uma das sete porcarias do mundo. A sexta é o elevado por cima da avenida São João, que parte da Barra Funda e termina na Radial Leste. Aliás, a Radial Leste é uma séria candidata a entrar na lista dos lugares mais feios do planeta. Ela e a região da Cracolândia, no entorno da estação da Luz, no centro da cidade, e as fontes de água da praça da Sé, que fedem.
Esse é o lado bom de morar em São Paulo. Poder falar mal da cidade onde vive sem ter de conviver com uma tropa provinciana que prefere atacar o blogueiro ao problema. Poucas pessoas vão falar algo do tipo “São Paulo é feia, concordo com todas as críticas, mas ninguém de fora pode falar mal da minha cidade feia e violenta e caótica”. Esse nativismo infantil, somado à falta de senso crítico diante dos problemas mais absurdos, gritantes, abre um latifúndio para o imobilismo, a apatia que fizeram a festa nos comentários deste blog. O “Pra Frente Manaus” de quase todos os comentários feitos aqui é um primo de terceiro grau do “Pra Frente Brasil” que criou monstrengos sem infraestrutura e condições mínimas de sobrevivência no meio da floresta. Ninguém me convence de que o ribeirinho acha o máximo viver no paleolítico ou de que os flagelados à beira dos igarapés de Manaus a-do-rem conviver com a água onde eles depositam seus dejetos.
Os xingamentos, a baixeza do debate, os olhos (e o nariz) fechados de boa parte das pessoas revoltadas com o texto talvez expliquem por que, na Ponta Negra, apartamentos tão caros convivam tranquilamente com aquele cheirinho todo próprio de esgoto curtido pelo sol. Ou por que em Adrianópolis as pessoas não se importem com os apagões constantes de energia elétrica por causa da energia suja e instável daqueles monumentos ao mau gosto e à ineficiência, as termoelétricas. Ou com o fato de ainda se morrer de diarréia, e em um número considerável, numa das maiores cidades do país. Ou com a falta de água encanada e um sistema de esgoto montado pelos ingleses no começo do século. Está tudo muito bom, está tudo bem para algumas pessoas que vivem numa ilha da fantasia, de frente para o rio Negro, nos seus carrões e apartamentos com ar condicionado a 18ºC, onde se deitam em espreguiçadeiras recobertas por uma pele de vaca para lá de cafona. Pegar a balsa rumo a Novo Airão é uma experiência bizarra. Parece uma viagem rumo a algum país miserável da África Subsaariana. Não é a Copa do Mundo que vai mudar essa situação. Manaus vive de utopia em utopia: borracha, Zona Franca. O que aconteceu nesses anos todos? É, é verdade. Pelos menos o asfalto chegou.
Gostar de Manaus é algo compreensível. Afeto é um belo dom da natureza e a cidade desfruta da paisagem fascinante do rio Negro e do encontro das águas. Mas classificar o município como a “Princesinha do Brasil” e virar as costas para as condições precárias em que ela se encontra, sinceramente, é inexplicável. A não ser, claro, que eu esteja lidando com uma amostra distorcida de comentaristas. É impressionante o número de pessoas que comentaram nesse blog com emails corporativos de órgãos públicos… Para elas, realmente, deve estar tudo muito bem. link
Leandro Humberto, Quem não sabe pensar xinga
Continua a valer ler os comentários ao novo texto.
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