Leio, hoje, na revista Veja:
Uma propaganda brasileira estrelada pela socialite Paris Hilton poderá ser tirada do ar após o Conar (Conselho de Autorregulamentação Publicitária) abrir três processos éticos contra a marca de cerveja Schincariol. A decisão foi motivada por denúncias de consumidores e da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, que consideraram a campanha de lançamento da 'Devassa Bem Loura' sexista e desrespeitoso para a mulher. (...) Segundo o Conar, a propaganda agora será investigada quanto à suposta "utilização de apelos à sexualidade e desrespeito moral às mulheres".
Eis o spot no centro da polémica:
Paris Hilton e Luma Oquenda em 'Devassa bem loura', produzido pela O2 para a agência Mood e a marca de cerveja Devassa
Já este, por exemplo, não me lembro de ter incomodado alguém:
Maryna Linchuk em 'Miss Dior Chérie Fragrance', realizado por Sofia Coppola para a casa Christian Dior, ao som de Moi Je Joue de Brigitte Bardot
Pois eu sinto muito, mas continuo a achar mais graça a este:
Rosie Huntington-Whiteley e Charlie Speed em 'Love me tender... Or else.', escrito e realizado por Greg Williams para a campanha do Dia dos Namorados da marca de lingerie Agent Provocateur
ou mesmo a este:
Juliette Lewis (instruída por Harry Dean Stanton a pedido de Traci Lords, para azar de Peter Horton) em 'Cheat', concebido por Paul Marciano e realizado por Andy Morahan para a marca Guess
(...)
Algumas breves notas:
- Não deixa de ser irónico que o pudor estale ainda sem o Rei Momo ter tido tempo de esfriar na cova, imediatamente a seguir ao Carnaval onde, como se sabe, a exposição sexual do corpo feminino é cabeça de cartaz da Cidade Maravilhosa no Mundo e os índices de consumo de cerveja atingem o seu máximo esplendor. Após um balizado período temporal de catársis, em que todos os excessos são consentidos e aplaudidos em apoteose, da Sapucaí ao beco mais recôndito da favela, passando pela praceta mais florida dos bairros familiares, a sociedade apressa-se a puxar a rédea para outra vez repor a ordem. Por mais ou menos moralidade que lhe assista a moral.
- Francamente falando: gosto muito do olhar de Sofia Coppola, adoro Paris (a cidade, não a socialite), sempre achei a canção deliciosa, não me interessa nada o flop dos talentos vocais da Bardot e sou mega-fã assumida da personagem BB. Francamente continuando: não aprecio por aí além as fragâncias dos perfumes Dior, não gosto de cor-de-rosa e os balões de sopro sempre me despertaram instintos muito mais perversos do que calmantes. Esclarecidos os pressupostos, prefiro Paris na sua, apesar de se perceber observada por um olho furtivo de macho, à tonteria tolinha da Linchuk, deslizando de bicicleta pelas ruas, à espera de encontrar num virar de esquina esse beijo de príncipe perfeito que lhe há-de tirar ainda mais os pés do chão.
- Da «utilização de apelos à sexualidade» não se segue nem pode inferir necessariamente um «desrespeito moral às mulheres». Estávamos bem mal se uma fosse correlato invariável da outra. Parece-me bem mais discriminatório supor a inevitável instrumentalização da mulher do que supor a sugestão de a sobrepor como possível instrumentalizadora.
- Mas falando muito a sério, sendo francamente franca, aquilo que prefiro mesmo é a crueza dos subliminares que se atravessam, pela mão de Rosie e Juliette, nos dois últimos spots. O poder de atracção é uma arma genética com que a Natureza fez o favor de dotar as fêmeas, talvez já prevendo as hipocrisias que a História trataria de lhes reservar. Se em tempos serviu para as punir, que sirva agora para também lhes assegurar ascendente. Fazer bom uso dela não deve de todo ser excluído do empowerment que urge.
* À laia de nota de rodapé: este último spot recebeu a medalha de ouro nos Clio Advertising Award TV/Cinema, em 1996.
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