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Matança indiscriminada de botos no interior do Amazonas

Posted: 13 de fev. de 2011 | Publicada por AMC | Etiquetas:


O abate do boto tucuxi (Inia goffrensis) não é uma prática nova, mas da forma como vem sendo realizada, requer indiscutivelmente uma maior atenção dos ambientalistas, pesquisadores e autoridades competentes.Em várias regiões do Amazonas, é um hábito recorrente das comunidades ribeirinhas, com vista à utilização da sua carne na pesca de uma espécie conhecida popularmente na Amazônia como piracatinga (Calophysus macropterus), ou birosca, também conhecida por mota e simi nas áreas da Colômbia e Peru, onde o peixe é comercializado.
As fotos testemunham, precisamente, uma dessas matanças de botos tucuxis, na localidade conhecida como "Boca do Cacau", a cinco minutos do município de Beruri - a 170 km de Manaus -, e foram captadas no último mês de Dezembro.
Os animais são mortos tanto com um arpão, como por meio de facadas - num processo de extrema violência a que os ribeirinhos chamam "sangrar o animal".
No local em que as imagens foram gravadas, não há qualquer fiscalização dos órgãos competentes, tanto no que se refere à orientação do ribeirinho para a captura da piracatinga de uma outra maneira, como no que diz respeito à sensibilização para o facto de o abate indiscriminado dos botos ser proibido por lei.
O apetite pela utilização da carne do boto na captura de pescado justifica-se por esta possuir bastante "pitiú" (cheiro peculiar do peixe na salga), um odor extremamente forte e intenso que atrai de forma infalível o peixe de hábitos carnívoros.
A estimativa dos ribeirinhos é a de que um boto adulto, cujo peso varia de 150 a 200 quilos, possa render a pesca de aproximadamente 600 unidades de piracatinga.
Entretanto, como se trata de um mercado negro, os ribeirinhos não contam com apoio de nenhuma cooperativa e vendem o pescado para um atravessador, que se encarrega de o comercializar na área de fronteira.
A utilização da carne de boto para a captura de algumas espécies de peixes é bastante comum em várias regiões da Amazônia. Em algumas zonas, além do boto, os ribeirinhos também utilizam a carne do jacaré-açu (Melanosuchus niger), uma prática que foi várias vezes denunciada aos órgãos competentes e objecto de investigação por parte de instituições como o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), Projeto Piatam, Instituto Socio Ambiental (ISA), entre outros.
Um relatório técnico, elaborado em 2003 pelo Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, sobre a pesca da piracatinga dava conta de que no ano 2000 havia já uma grande utilização das duas espécies para isco na captura de peixe, tendo como principal mercado a Colômbia, onde aparecia comercializado em forma de filés.
O mesmo relatório oferecia, aliás, algumas sugestões para conter o abate indiscriminado de botos e jacarés – evitando o desequilíbrio ambiental provocado –, bem como alternativas para a captura da piracatinga.   
Entre as propostas apresentadas no documento figuravam, por exemplo, a sugestão de um melhor controle na região de fronteiras – uma vez que o peixe capturado em território  brasileiro era comercializado informalmente na Colômbia –, a identificação dos ribeirinhos que se dedicavam à pesca da piracatinga e a avaliação dos impactos da caça ilegal  de botos e jacarés.    
Em 2008, investigadores do Inpa, Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Renováveis (Ibama), Projeto Piatam e da fundação colombiana Omacha, tinham já reunido para discutir o impacto da caça do boto com destino à pesca da piracatinga. Na ocasião, a cientista Sandra Beltrán, do Projeto Piatam, chamou a atenção para o facto de a acção económica, relacionada com a captura do pescado, gerar riscos para a espécie sacrificada, alertando nomeadamente para que em algumas áreas, como  por exemplo, no médio e alto Purus, a situação se revelava verdadeiramente alarmante, pedindo por essa razão uma atenção redobrada para fazer face ao abate indiscriminado dos animais.

publicado no jornal A crítica em 08 de Janeiro de 2011

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