O Massacre de Eldorado dos Carajás, em 1996
Palco do assassinato de 19 sem-terra em 1996, no episódio que ficou conhecido como o massacre de Eldorado dos Carajás, o Pará continuou escrevendo páginas horrendas de violência no campo. De lá para cá, nada menos que 212 pessoas foram assassinadas em conflitos agrários, a exemplo de José Cláudio e Maria do Espírito Santo. Na média, desde 1996, foram 14 execuções por ano. Outras 809 sofreram ameaças de morte. Os dados constam de levantamentos da Comissão Pastoral da Terra (CPT), que avalia a situação na região de Marabá, onde o casal de ambientalistas foi morto, como a pior do estado.
Cf. também:
- Clima de revolta marca cerimônia de 7º dia da morte do casal de ambientalistas no Pará
- Planalto convoca reunião de emergência para conter assassinatos na Amazônia
- Amigos e parentes denunciam descaso do poder público
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- Suspeito de executar a tiros o líder do Movimento Camponês Corumbiara é preso em Rondônia
- Polícia identifica dois suspeitos da morte de líder camponês
- Testemunha da morte de extrativistas foi encontrada morta
- Casal de líderes extrativistas foi morto em tocaia no Pará
Depois de Carajás
por Prof. Fausto ArrudaOs assassinos de 19 camponeses, no massacre de Eldorado dos Carajás — cujo sétimo aniversário transcorreu em 17 de abril deste ano, marcado por manifestações em praticamente todos os estados brasileiros — continuam impunes. Embora os relatos da crueldade empregada pela repressão tenham despertado a indignação de milhões de pessoas em várias partes do mundo.
Apenas num Estado dominado por latifundiários pode a justiça ter tal procedimento. Lamentar para quê? Como na história do sapo e o escorpião, "faz parte da sua natureza." Chamar isso de "tal de democracia", somente podem os incautos ou os beneficiados com a miséria e a exploração do nosso povo.
Mais que lamentar, cabe aqui registrar o que a história já consagrou como lei: "o sangue dos mártires rega o chão da luta." Como está o movimento camponês depois de Corumbiara e Eldorado dos Carajás? E sendo assim, qual o nível de consciência dos camponeses quanto a distinguir quem são os seus amigos e quem são os seus inimigos?
Na verdade, o movimento camponês brasileiro vem enfrentando galhardamente os seus inimigos. Sejam os que se apresentam de frente, como o latifúndio com sua justiça, sua polícia e seus jagunços, seja os que de forma sorrateira, como os oportunistas, traficam com sua luta para garantir um lugarzinho no velho e podre Estado burguês-latifundiário serviçal do imperialismo.
Gradativamente, o monopólio de uma determinada sigla sobre o movimento é, não apenas questionado por dentro, diante da paralisia e ilusão com o novo gerenciamento do Estado, como efetivamente quebrado pelo surgimento de uma infinidade de organizações de camponeses pobres dispostos a tomar a terra e destruir o latifúndio.
No Pará, sementes de lutas — como Araguaia, Rio Maria, Perdidos, Cachoeirinha e outras consideradas adormecidas — hoje são brotos que vicejam nos quatro cantos do Estado, bem temperadas no enfrentamento com a forma moderna de perseguir o povo, chamada de "força tarefa" (operações combinadas dos órgãos de repressão e Ibama), ou com a velha forma representada pelos jagunços e curiós.
No Nordeste, a tomada de terras e o corte de rodovias tem mostrado a vitalidade da luta e a disposição dos camponeses de não esperar pelo Incra — corrupto e carcomido instrumento dos latifundiários — que o governo do Partido dos Trabalhadores (?), mais aliado do que nunca às oligarquias, busca dar nova aparência para seguir cumprindo as mesmas ordens dos mandões nacionais com os seus grandes patrões estrangeiros.
No sul e no sudeste, as ameaças de latifundiários de formar organizações criminosas para perseguir os camponeses não surtiram efeito prático sobre os movimentos de massa na região. O movimento camponês retoma mais áreas e aprimora ainda mais a organização da produção, da comercialização e da própria vida dos camponeses livres, imprimindo a sua marca na solução de problemas como a produção diversificada, a instrução pública, o abastecimento de suas famílias e das populações vizinhas, etc.
Porém, a pressão dos latifundiários não foi inócua. Registramos que a partir dela o ministro do Desenvolvimento Agrário fez um recuo em seu discurso de suspender as medidas de Cardoso de criminalizar a desapropriação feita pelos camponeses pobres e médios da camada inferior contra os latifundiários que roubam imensas faixas de terra do povo trabalhador e do país.
Em Rondônia, o chavascal de fraudes na distribuição de terras entre a oligarquia local e seus apaniguados tem sido desmontado pelo movimento dos camponeses pobres que, inclusive, levou ao ministro nomes de matadores de camponeses que, na região, agem sob proteção do governo estadual. Em várias oportunidades, os ataques dos jagunços têm sido revidados, o que os leva a pensar duas vezes antes de atacar.
Democracia sem a extinção do latifúndio?
Dados do IBGE sobre a situação da terra dão conta de que, de um total de 353 milhões de hectares, a metade (178 milhões) está ocupada por pastagens; 94 milhões são de matas e florestas; 15 milhões são de terras inaproveitáveis; 50 milhões constituem a área de lavoura atual e há 16 milhões de hectares de terras produtivas não utilizadas.Da área plantada de 50 milhões de hectares, 37,8 milhões estão ocupados com a produção de grãos. Nessas áreas cultivam-se, principalmente, café, soja, algodão, milho, além de cana-de-açúcar, laranja para suco e fumo. A área cultivada restante produz arroz, trigo, feijão e culturas permanentes, como as hortifrutigranjeiras.
Assim, enquanto imensas propriedades agrícolas estão dominadas pelo modelo de grandes propriedades sentadas na monocultura para exportação — altamente mecanizadas e servidas dos avançados recursos tecnológicos, sementes melhoradas, etc. — a menor parte, formada por médios e pequenos proprietários, é a que se dedica à produção diversificada, destinada, principalmente, ao abastecimento interno.
De acordo com o último censo agropecuário, de um total aproximado de 5,5 milhões de propriedades (desde pequenas propriedades até as de dezenas e centenas de milhares de hectares), 1% — apenas 55 mil — de propriedades latifundiárias (acima de mil hectares) representam 48% das terras tituladas e totalizam 172 milhões de hectares. Em contrapartida, no outro extremo, os que detêm propriedades e somam 5 milhões de hectares correspondem a 21% das terras tituladas. Dentro destas, os que possuem até 20 hectares representam 70% e possuem 6% das terras.
Mas, no conjunto, a agricultura encontra-se submetida pela grande indústria e pelo capital financeiro, ambos, por sua vez, associados aos grandes grupos mundiais. É a base das relações de intensa exploração da cidade sobre o campo. Isto conduz ao agravamento extremo, à dependência e à subjugação do país às potências estrangeiras.
Seguramente não há país no mundo onde a concentração e o monopólio da propriedade da terra se assemelhe ao Brasil. Em razão direta disso, existem 5 milhões de famílias de camponeses sem terra.
Dessa mata não sai coelho
O governo FMI/Oligarquias/ PT colocou nos ministérios da agricultura, da indústria e comércio homens intimamente ligados ao agrobusiness.Desde o governo Cardoso, o Banco Mundial e outras fontes externas de financiamento vêm direcionando as pesquisas da Embrapa e das universidades para a exportação e, agora, com o retorno do "exportar é o que importa", novamente tendo o senhor Delfim Neto como "guru". Tudo indica que a velha estrutura fundiária brasileira será alterada apenas para incrementar a incorporação de terras, para continuar servindo de fonte de acumulação dos latifúndios e burguesia burocrática nativas, bem como do capital financeiro mundial.
Mantida a velha estrutura fundiária, agora "embrulhada para presente" através de modificações e iniciativas que visam maior "competitividade no mercado exterior", somadas aos desígnios exportadores dos ministros, e as instituições, como o Incra, Banco do Brasil, Basa, BNB, Emater, tudo seguirá como antes no latifúndio do Abrantes.
As disputas entre os candidatos do sub-governo para dividir e ocupar os melhores cargos destas instituições gestoras dos projetos agrobusiness, apenas mostram a verdadeira face do oportunismo daqueles que, "cansados da luta dura" de enganar o povo, buscam a sua vez nos confortáveis gabinetes.
E com que ansiedade invocam sua "autoridade" de representantes das campanhas clericais, tecnoburocráticas e revisionistas da contra-reforma agrária!
São os technopols emergentes, a mais nova e promissora safra de servidores para cada uma das modalidades em que se praticam os interesses latifundiários, da grande burguesia e do imperialismo em nosso país. Desertores da resistência nas décadas de 60 e 70; trotskistas confessos ou sujeitos apenas a pequenas recaídas; ex-kruschovistas; hoxistas arrependidos; monarquistas; cristãos fundamentalistas; a mais nova geração formada no Iadesil, etc., etc. Enfim, competentes para repetir "de cor e salteado" quaisquer doutrinas e teorias da moda e conceitos correspondentes, desde que aprovadas pela Nova Ordem do imperialismo. Gente preparada e disponível se expressa (e principalmente, obedece) em inglês, admiravelmente. Mas também entende e fala o dialeto tucano. E mais, controla com grande habilidade a massa dos seus militantes, com medidas administrativas, ou através de oposições ajustáveis, quantas queiram e necessitam para manter a maioria Articulação.
A propósito, os "eleitores militantes" já foram dispensados. Agora a propaganda eleitoral, pouco a pouco, adotará um estilo mais adequado ao novo ambiente. Pressa para resolver os problemas do imperialismo e de seus associados internos, e paciência, muita paciência, quando se trata de reivindicações populares — conquanto promete conservar a expressão "companheiros".
Porém, o movimento camponês, rapidamente, começa a se livrar destes oportunistas. Já demonstrou que jogará por terra todas as ilusões ainda existentes e se encontra consciente e decidido para cumprir sua tarefa histórica de liquidar a oligarquia latifundiária no Brasil.
publicado no Jornal Nova Democracia nº9
A saga dos pobres em Serra Pelada
por José Ricardo Prieto
Pensar Serra Pelada é pensar também nesse sonho do Eldorado e em como esse sonho foi manipulado, se transformando na epopéia de mais de 100 mil garimpeiros, sendo mais de 70% nordestinos.
Do sonho à tragédia
Foi em 1980 que se encontraram as primeiras pepitas de ouro no lugar conhecido como Açaizal, distante aproximadamente cem quilômetros da sede do município de Marabá. Já um mês depois o aglomerado de pessoas nos arredores passava de cinco mil. A notícia corria longe e atraía levas e mais levas de maranhenses, piauienses, cearenses, baianos, paraibanos e outros. Instalado o garimpo, logo chega à região a primeira comitiva do governo federal. Foi quando o major Sebastião Rodrigues de Moura, vulgo Sebastião Curió, toma em suas mãos o controle da área, controle que iria se perpetuar por muito tempo.Curió é uma sinistra figura do aparato repressivo brasileiro. Teve ativa participação no combate ao movimento conhecido como Guerrilha do Araguaia. Muitos dizem que ele sabe onde se encontram diversas ossadas dos participantes da guerrilha, tidos como desaparecidos, mas se nega sequer a tocar no assunto.
Curió participou também no episódio do Massacre da Lapa, onde importantes membros do Comitê Central do PCdoB foram delatados e assassinados. Hoje, Curió exerce o segundo mandato de prefeito no município de Curionópolis (cidade de Curió, em sua 'homenagem'), cuja área engloba as terras de Serra Pelada.
Desde o início, Sebastião Curió se auto-intitulou coordenador do garimpo, sendo que por esta época era agente do Sistema Nacional de Informação (SNI). Posteriormente tornou-se presidente da primeira cooperativa de garimpeiros (Coomi-gasp) e, em seguida, elegeu-se deputado federal pelo PFL, fazendo da luta garimpeira um palanque . Sua condição de parlamentar e de oficial da reserva livrou-o de dezenas de inquéritos, inclusive por assassinatos. Atualmente ele é um dos que negocia junto à Companhia Vale do Rio Doce os destinos de Serra Pelada, mesmo com o repúdio de grande parcela dos garimpeiros.
Curió deve
Dentro de Serra Pelada Curió significou o controle absoluto do regime militar. Com total apoio do general-presidente João Batista Figueiredo (que esteve pessoalmente na área), Curió manobrou, mentiu, fez populismo, instigou, negociou, justiçou. Uma de suas primeiras medidas foi recolher todas as armas de fogo dos garimpeiros, alegando que as mesmas seriam devolvidas, devidamente acompanhadas de registro federal. O povo desarmado ficou refém das armas 'oficiais'.Instalaram-se nas vias de acesso ao local vários postos de revista da Polícia Militar e Federal, impedindo que muitos sequer chegassem ao garimpo. Mesmo assim a presença dos 'furões' (sem autorização) era grande. Nesses tempos Serra Pelada era considerada Área de Segurança Nacional. Junto com a polícia vieram também algumas pequenas agências bancárias e as igrejas. No auge da mineração foi proibida a entrada de bebidas alcoólicas e mulheres, fazendo surgir um mercado interno clandestino de cachaça e prostituição. Às oito e às dezoito horas havia em Serra Pelada o hasteamento das bandeiras do Brasil, do Pará e de Marabá, tudo ao som do hino nacional. Essa era uma prática que buscava identificação, reconhecimento e legitimação da presença ostensiva do Estado dentro do garimpo. A aparente ordem e disciplina militares contrastavam com o grande número de conflitos internos, com a onda de doenças facilmente debeláveis, como hepatite, pneumonia, hanseníase e principalmente malária, isso sem contar com os inúmeros acidentes de trabalho (desmoronamento de barranco, mutilações, etc) e a progressiva contaminação pelo mercúrio.
Como verdadeiras válvulas de escape à dura realidade e às desumanas condições de trabalho, foram levados até Serra Pelada vários eventos como shows, reportagens enaltecendo o lugar (Rádio Nacional de Brasília, rede Globo de televisão) e até Os Trapalhões. Crescia assustadoramente o número de cabarés e bordéis nas proximidades, onde a figura do garimpeiro com grosso cordão de ouro, dente de ouro e um enorme toca-fitas a tiracolo era sinônimo de esbanjamento de dinheiro. Carros novos, chuva de dinheiro e excessos desnecessários faziam parte da vida dos garimpeiros que 'bamburravam' (enriqueciam).
Alguns casos viraram lendas, como o do garimpeiro que só tomava banho com água mineral e do outro que fretou um Boing 747, de Belém a São Paulo, somente para visitar uma antiga namorada. Mas essas histórias de fortuna não passaram de pequenas gotas num oceano de frustração e pobreza.
A grande massa garimpeira entrou em Serra Pelada pobre e saiu miserável (quando saiu!). Muitos daqueles homens se transformaram num enorme exército de reserva, ocioso, à disposição dos latifundiários locais. Ao contrário do que prega o senso-comum na região, a ruína dos garimpeiros não se deu graças a seu 'despreparo' para administrar o dinheiro ganho. Sua desgraça foi a própria formação do garimpo (e seus apêndices), a própria ilusão do enriquecimento relâmpago ao alcance de todos, a corrida alucinada do ouro a qualquer custo. O sonho não realizado levou-os à tragédia.
A falência de Serra Pelada foi que os militares tentaram fazer dela uma política para se contrapor aos ideais de justiça e rebeldia defendidos e propagados pelos guerrilheiros do Araguaia.
Buscava-se canalizar tensões sociais existentes — os anseios do povo por vida digna — para uma aventura individualista e cega pelo ouro. Mas o fracasso desse projeto veio logo porque, ao aglutinar um gigantesco contingente de pobres num determinado espaço, as demandas do Araguaia (que são as demandas das mais humildes camadas) por pão, terra e justiça rapidamente vieram à tona. E o caldeirão ferve até hoje, sendo que os conflitos agrários do sul do Pará muito se devem àqueles que, instalados na região e sem alcançar o prometido Eldorado, lutam agora por seu justo pedaço de chão.
Fantasma da guerrilha
Serra Pelada já foi considerado o maior garimpo manual do mundo. Diz-se que de lá foram extraídas 40 toneladas de ouro, o equivalente a mais de 1 bilhão de dólares. Pesquisas da Vale do Rio Doce (detentora dos direitos de exploração da área, desde 1989) detectaram a presença de uma super-jazida de 150 toneladas de ouro, localizada a 400 metros de profundidade.Segundo os engenheiros da Vale, são necessárias modernas técnicas de mecanização para se atingir o ouro. Só que os participantes do auge de Serra Pelada ainda lutam por seus direitos sobre a área, sendo que muitos ainda permanecem no local. A Vale chegou a propor, como indenização aos garimpeiros cadastrados em cooperativa, a construção de casas e 6 mil reais por cabeça. Essa proposta, obviamente, foi rechaçada pelos garimpeiros.
As disputas e interesses por Serra Pelada seguem gerando conflitos e mortes na região. As divergências passam também por um fundo de R$ 150 milhões, depositado à época em nome dos garimpeiros na Caixa Econômica Federal, que nunca foi resgatado. Muitos trabalhadores não conseguem provar que realmente estiveram no garimpo e o tumulto é grande quando há algum tipo de recadastramento. O que está em jogo é quem ficará com todo esse dinheiro e quem terá direito à "laje de ouro", como alguns chamam a jazida.
A luta encarniçada que acontece na região pela destruição do latifúndio é um outro capitulo da história atual dos garimpeiros que, na verdade, nada mais são que camponeses pobres saídos de sua terra, pessoas que sonharam e ainda seguem sonhando com libertação. A tentativa de dissipar o "fantasma da Guerrilha" do sul paraense definitivamente não vingou. E o povo o tem demonstrado no decorrer desses anos, com suas lutas radicalizadas, seu espírito, sua disposição, seu sangue.
É preciso captar as lições de Serra Pelada, essa saga de milhares de pobres. A luta de classes desenvolve-se à revelia das artimanhas e estratégias dos poderosos. Onde quer que exista opressão necessariamente haverá insubordinação. Onde quer que haja massas em movimento necessariamente estarão presentes as bandeiras e anseios do Araguaia. Enfim, cabe dizer que onde houver povo, este tratará sempre de ressuscitar Oswaldão, Dina, Helenira, Grabóis (pai e filho)... e suas palavras de alforria.
Cresce violentamente a luta camponesa no Pará
Mortes, despejos, prisões, bloqueios de rodovias. O constante conflito entre camponeses pobres e latifundiários na região sul do Pará se agravou consideravelmente nas primeiras semanas do mês de junho. Tudo graças ao início de uma nova ofensiva político-militar do Estado brasileiro, que determinou o cumprimento de 42 mandatos de reintegração de posse na região.
O Comando de Missões Especiais da Polícia Militar do Pará, dividido em Comando de Operações Especiais, Tático, Canil, Cavalaria e Tropa de Choque conta com cerca de 250 homens, além de apoio de órgãos como Incra, Ibama, Polícia Federal e Vara Agrária começaram as ações pelo município de Conceição do Araguaia, onde aproximadamente 300 famílias camponesas viram seus barracos serem derrubados, suas roças queimadas, além de serem deixadas à própria sorte nas ruas da cidade. Agora a polícia concentra-se nos municípios de Xinguara, Curionópolis, Canaã dos Carajás, Parauapebas e Marabá.
Diante de toda humilhação e truculência com que foram arrancados de suas terras, os camponeses da região, muitas vezes se rebelando contra dirigentes vacilantes e politiqueiros, organizaram um gigantesco bloqueio das rodovias sulparaenses. Marabá, principal centro econômico da região, ficou completamente isolada.
Foram interditadas as rodovias PA-150, que liga Marabá a Eldorado dos Carajás; a Br-222, rumo à cidade de Dom Elizeu; e a Br-230 (Transamazônica), onde inclusive segue em plena atividade a Operação Pacajá, comandada pelo Exército brasileiro desde o assassinato da missionária americana Dorothy Stang. O movimento fala agora em interditar a Estrada de Ferro Carajás (da Companhia Vale do Rio Doce) e até o aeroporto de Marabá, como forma de exigir do Incra alguma posição quanto aos camponeses despejados.
A situação piorou bastante após o assassinato de Antônio Matos Filho, um dos fundadores do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Parauapebas. Desconfia-se que sua morte seja fruto da ação de pistoleiros a mando de fazendeiros. A 23ª Brigada de Infantaria de Selva tem feito movimento na região e o clima é de guerra. Helicópteros, sirenes, tropas, criminalização na imprensa local.
Os índios da tribo Gavião-Parkatejê entraram em choque com manifestantes que bloqueavam a estrada de acesso à aldeia Mãe Maria.
O Sindicato dos Produtores Rurais de Marabá, representante da classe latifundiária da região, entrou com uma representação criminal junto à Justiça Federal exigindo que as rodovias sejam desobstruídas. Também assinam essa representação à Prefeitura e Câmara Municipal de Marabá, o Rotary Club, a Loja Maçônica, Lyons Club e alguns empresários. Reivindicam seu "constitucional direito de ir e vir". Só não pronunciam sequer uma palavra sobre os absurdos e 'ilegalidades' cometidas contra os pobres como os espancamentos que ocorreram e a fome que agora ronda as famílias desalojadas.
Os camponeses têm jogado por terra as últimas ilusões que ainda mantinham com relação à administração FMI-PT e sua prometida "reforma" agrária. E a cada nova tropa que desembarca no sul do Pará, cresce o ódio dessa legião de homens e mulheres que não abrirão mão da luta contra o latifúndio, em busca de dignidade.
publicado no Jornal Nova Democracia nº26
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