Eleito presidente do Peru neste domingo, o nacionalista Ollanta Humala vinha procurando se distanciar de um discurso mais próximo do presidente venezuelano, Hugo Chávez, para garantir sua vitória.
Derrotado na disputa presidencial de 2006, o ex-militar Humala teria se inspirado na trajetória de Luiz Inácio Lula da Silva para mudar de estratégia na campanha, adotando um tom mais conciliador.
Sua proximidade de Chávez em 2006 foi considerada por analistas um dos fatores determinantes da derrota para Alan García, o atual presidente.
"Há uma campanha muito forte da direita e dos meios de comunicação contra Chávez, o que acaba promovendo a rejeição da população", disse Fernando Villáran, um analista político peruano. "O distanciamento era inevitável", acrescentou.
Petistas em campanha
Não é mera coincidência que a frase "a esperança vence o medo", que marcou os discursos de Humala, se pareça com um slogan eleitoral de Lula.
Luís Favre, ex-marido da senadora Marta Suplicy (PT), e o petista Valdemir Garreta assessoraram a campanha do centro-esquerdista Humala a partir de janeiro.
"Poucas vezes falei diretamente com eles, a campanha se encarrega disso, minha preocupação é viajar pelo país", disse Humala sobre os assessores.
Para Villarán, a proximidade com o discurso de Lula foi um dos fatores que alavancaram a candidatura de Humala na reta final da campanha: "O povo peruano tem uma boa imagem de Lula e qualquer político que se aproxime de suas políticas tende a capitalizar apoio."
Humala também apostou na mudança do visual. Trocou o vermelho das camisas, também usado por Chávez, pelo branco. Apesar de ter sido alvo permanente de ataques de seus adversários, Humala optou por não contra-atacar, estratégia que o favoreceu, segundo analistas.
Durante a campanha, propôs um "pacto político", a manutenção da estabilidade econômica, o combate à corrupção e a distribuição de renda, dirigida fundamentalmente aos setores populares.
'Contradições'
Já em seu programa de governo, o candidato nacionalista subiu o tom: criticou duramente o modelo neoliberal e prometeu recuperar a soberania dos recursos naturais do país como base para o fortalecimento da economia. Humala propôs, inclusive, mudanças na Constituição, ponto de partida que marcou o início dos governos da Venezuela, Bolívia e Equador. No documento, o candidato nacionalista prometeu ainda rever contratos de exploração petrolífera e de gás nas mãos de multinacionais.
É principalmente na nova roupagem dessas críticas e projetos que teria entrado o "toque brasileiro", incluindo com a elaboração da Carta ao Povo Peruano, semelhante à Carta ao Povo Brasileiro do ex-presidente Lula nas eleições de 2002. Nela, aspectos do programa que poderiam assustar os mercados foram suavizados ou suprimidos.
Na carta, Humala diz que não promoverá a reeleição presidencial, não menciona nacionalizações de empresas e tampouco critica a liberalização da economia, credora de elogios do crescimento econômico de 8,8% registrado no Peru no último ano.
por BBC Brasil via Estadão
por Patrícia Campos Melo
O candidato de esquerda Ollanta Humala se consolidou como líder na campanha eleitoral peruana. Nos últimos levantamentos --que não puderam ser publicados no país, por lei eleitorais que determinam lei-seca de pesquisas a uma semana do pleito-- Humala aparece com 28% dos votos, seguido de Keiko Fujimori com 21%. Keiko é uma populista de direita que é filha do ex-presidente Alberto Fujimori, atalmente cumprindo pena de 25 anos por corrupção e violações de direitos humanos.
Em 2006, quando se enfrentaram no segundo turno Ollanta Humala e o atual presidente Alan García, o Nobel peruano Mario Vargas Llosa comparou a disputa a uma escolha entre "o câncer e a aids". Ontem, ao descrever um possível segundo turno entre Humala e Keiko, afirmou: "seria verdadeiramente uma catástrofe para o Peru."
A grande pergunta que atormenta analistas e parte dos eleitores é a seguinte: Humala realmente se transformou em um candidato mais moderado, ou é apenas "lobo em pele de cordeiro", como acusa seu rival Alejandro Toledo?
Para se tornar mais palatável ao grosso do eleitorado, que teme sua postura agressiva e estatizante, Humala lançou sua versão 2011 - Ollanta Paz e Amor. Para isso, teve ajuda dos petistas Valdemir Garreta e Luís Favre, que atuam na campanha do candidato, que teve direito até a sua "Carta ao povo Peruano", nos moldes da Carta ao povo brasileiro de Lula.
Conversei longamente com Salomon Lerner, o chefe da campanha de Humala. Ele me garante que não se trata apenas de retórica de campanha. "Ollanta amadureceu, abandonou posturas mais radicais que tinha em 2006, nós aprendemos com a história." Humala quer distância de Hugo Chávez, que deu uma rasante no Peru na reta final da eleição passada e enterrou as chances do candidato peruano no segundo turno do pleito de 2006. Assim me garante Salomon, ativista da comunidade judaica que conheceu Humala em 2005, quando o candidato foi acusado de ter posições anti-semitas. Acabaram ficando muito próximos e ele passou a chefiar sua campanha.
Houve, está claro, um "extreme makeover" na imagem de Humala. Está fora o look combatente de selva. Agora, usa ternos bem cortados, ou camisas azuis. Sorri bem mais. Ostenta sua fé católica. No debate, fez tanto esforço para não parecer agressivo, que não entrou em disputa nenhuma com os outros candidatos --e tentou responder muito pouco.
Mas entre os pontos polêmicos, como renegociação de contratos com mineradoras, concessões para as hidroelétricas construídas por empresas brasileiras na Amazônia peruana, reforma da constituição, ele ainda precisa explicar mais. Muito do que propõe, de fato, está em estudos no Brasil e foi feito até no Chile, no caso de aumento de royalties da mineração. Não se rompem contratos. Simplesmente se negocia com as empresas quando terminam os contratos - e, no Peru, grande parte vence em 2012 e 2013. Ou tenta-se adiantar os reajustes, mediante barganhas. Tudo dentro do jogo capitalista.
Dentro da campanha, há a visão de que se deve seguir o modelo brasileiro de engordar o mercado doméstico e não apenas depender de exportação de matérias-primas. E, dentro disso, aumentar as contrapartidas das multinacionais que estão explorando recursos no país --seja por meio de aumento nos royalties, ou exigindo agregação de valor.
O povo peruano quer melhor distribuição de renda e sente-se injustiçado pela exploração dos recursos naturais do país, cujas riquezas não chegam até suas mãos. Mas eles reconhecem que o Peru é uma história de sucesso. A estabilidade macroeconômica construída por Toledo, Alan García e, até, Fujimori, foram muito importantes para o atual crescimento. O desafio é manter a estabilidade, mas agregar políticas sociais.
No caso de Humala, falta muito a ser explicado para que possamos saber se ele está mais para Lula ou mais para Chávez. E as propostas para reforma constitucional, com seus ecos chavistas ou até fujimoristas, ainda assustam.
por Luis Maluf
Quando a bolsa de valores de Lima iniciou suas operações hoje, a queda já era de 8,71%. Um devastador medo tomou conta dos investidores, afinal, poderiam perder o que foi investido em anos de negociações, caso o governo simplesmente ignore os contratos e resolva nacionalizar tudo.
Muitos estão comparando a eleição dele à de Lula. O candidato peruano chegou até a divulgar uma “Carta ao Povo Peruano” com o mesmo teor que Lula passou na “Carta ao Povo Brasileiro”, salientando que respeitará os investidores e contratos assumidos, a manutenção do mercado e tudo que o liberalismo defende. No caso brasileiro, isso foi verdade, e felizmente não rompemos com modelo atual em prol de um sonho de esquerda que não se concretiza sem muito sofrimento.
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